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Coordenadoria Estadual da Mulher estuda implantação de uma Sala Lilás em Mossoró

Mossoró deverá contar com mais um equipamento para atender as mulheres em situação de violência. A instalação da Sala Lilás, espaço de acolhimento a vítima de violência doméstica, já vem sendo discutida e a perspectiva é de que seja implantada em junho.  

Segundo informações do site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), a coordenadora da CE-Mulher do TJRN, a juíza Fátima Soares, já esteve em Mossoró para falar sobre o assunto. O encontro aconteceu em abril com o titular do Juizado da Violência Doméstica de Mossoró, o juiz Renato Magalhães. 

Em matéria publicada no site consta que a inauguração do espaço deverá integrar a programação de celebração dos 130 Anos do TJ potiguar. “É importante que a população saiba que o nosso Tribunal está atento à questão de proporcionar um atendimento digno às vítimas da violência doméstica e familiar”, aponta a magistrada.

Na conversa com o colega magistrado, também entrou em pauta a instalação e funcionamento da nova equipe multidisciplinar da Coordenadoria da Mulher, na região Oeste do Rio Grande do Norte, cujas ações são coordenadas pelo magistrado Renato Magalhães.

Atualmente, o Poder Judiciário potiguar conta com duas Salas Lilás, uma no Anexo da Ribeira (antigo Grande Hotel) e a outra, no Centro Judiciário Varella Barca, na Zona Norte de Natal. “Estamos interiorizando nosso projeto, por isso a próxima será aberta em Mossoró”, salienta Fátima Soares. “Essa sala será um instrumento de enorme utilidade para essa parte mais sensível da população (vítimas de violência doméstica e familiar), que precisará mais do que nunca de uma recepção profissional e atenciosa”, ressalta.

As “Salas Lilás” são idealizadas para oferecer conforto e segurança as mulheres. “Trata-se de um local equipado para realização de exames periciais da equipe multidisciplinar composta por psicólogas, assistentes sociais, pedagogas e policiais femininas da Patrulha Maria da Penha”, pontua. 

As salas atuam com a parceira da Patrulha Maria da Penha, tanto na esfera estadual como na municipal.

 

Fonte (www.tjrn.jus.br)

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Cebi realiza Vigília de Oração Pela Vida das Mulheres na praça São José, as 18h

Faltam poucos dias para o 8 de Março. Em Mossoró uma série de atividades estão programadas para acontecer, como é o caso do grande ato na Praça do Pax, às 16h30, e outras já estão sendo executadas. Além do ato principal, as organizações e coletivos feministas já vêm desenvolvendo ações alusivas ao 8M.

Neste sábado (05) acontece a Vigília pela Memória das Mulheres Presentes na Caminhada, na Praça Pe. Guido Tonelloto (Praça da Igreja S. José), às 18h. O ato é organizado pelo Centro de Estudos Bíblicos (Cebi), que integra as entidades que lutam pela Vida das mulheres.

De acordo com Zélia Cristina Pedrosa, da assessoria da Cebi, é importante a presença de todas em mais um momento de luta. Na Vigília serão lembradas, especialmente, as mulheres que se dedicaram à luta antes de nós.

“Como entidade ecumênica que se dedica à leitura libertadora da Bíblia, nós propomos uma vigília de oração, preparando esta jornada de lutas. Celebramos a grande bênção de sermos mulheres. Nossas ideias, nossos dons, tudo o que nos faz mulher e que nos fortalece cada dia para seguir lutando e abrindo caminhos para que este mundo seja diferente, inclusivo e igualitário em relação a direitos e oportunidades”, destaca Zélia.

O momento é de recordar as muitas mulheres que abriram caminhos e lutaram pelo fim da violência contra mulher e reivindicaram nossos direitos. “Unimo-nos em uma corrente, em uma rede com toda nossa rica região latino-americana e caribenha para celebrar este dia, dando graças a Deus por nos criar à sua imagem e semelhança, delicadas e fortes, sensíveis, inteligentes e valentes, lutando dia a dia e fazendo que nossas vozes sejam escutadas”, finaliza.

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Talento, criatividade e empreendedorismo das crocheteiras messienses

É de uma agulha, um novelo de lã, criatividade e, principalmente, da paciente arte de alinhavar fios, que nascem as produções das crocheteiras de Messias Targino. Roupas, produtos de enxoval, chapéus, moda praia e mais uma variação de produtos já ultrapassam o mercado messiense e hoje chegam às lojas de renome nacional.  

O crochê sempre fez parte da história da cidade, porém, poucas mulheres se dedicavam à arte. Atualmente um grupo de mulheres vem se destacando no segmento com a produção de peças modernas e que seguem as tendências do mercado. A cidade hoje conta com mais de trinta artesãs, de todas as idades. As mais novas, influenciadas pelas veteranas que têm se engajado no trabalho de ensinar e orientar a quem é iniciante. 

Atualmente o crochê não é mais visto com a percepção apenas de um trabalho realizado pela mulher “prendada” que “já pode casar”, mas como uma expressão artística, empoderamento, autonomia financeira. Afinal parte das mulheres tem essa arte como fonte principal de renda, outras, como complemento que faz a diferença no orçamento no final do mês.

 

 

A forma tradicional de produzir ainda existe entre parte delas. Algumas ainda ficam nas calçadas, geralmente em grupos, em suas cadeiras de balanço, fazendo sua própria jornada de trabalho. Maria das Dores da Silva, 74 anos, é das mais antigas. Profissional que se destaca no bordado, corte e costura e no crochê, dona Maria é considerada uma verdadeira artista e sempre foi muito solicitada na cidade pela dedicação nas peças que produz. “A minha vida toda me dediquei a esse trabalho. Hoje, sigo fazendo minhas peças e orgulhosa do meu trabalho”, frisa.    

Luciete Jales tem sua história profissional diretamente ligada ao crochê. Desde os 12 anos que sua fonte de renda vem do artesanato. Habilidade registrada e reconhecida no biscuit, boneca de pano, pedrarias e, com um foco maior nos produtos de crochê. O mais importante, segue repassando o conhecimento e garantindo novos talentos. “Ter esse trabalho reconhecido e ver nossos produtos sendo valorizados é muito estimulante para gente continuar produzindo e reproduzindo novos talentos. É um prazer poder transmitir o que sei para as novas gerações, dessa forma, garantindo o seguimento dessa arte”, disse.

Além de ser fonte de renda, o crochê também movimenta a economia local, considerando que muitos dos produtos são vendidos dentro da cidade. Os preços variam. Existem peças de quatro reais e existem peças que chegam a trezentos reais. A venda é feita individual, ou seja, por cada crocheteira, e através de negociação entre lojas e a Secretaria de Cultura, que é quem dirige o projeto Messias Targino Terra do Crochê. 

A contrapartida do Município é feita por meio de um convênio com a Moda Depedro, uma marca que vem proporcionando voos a empreendimentos do segmento da moda e quem abriu as portas para o projeto. “Nesse convênio, a Prefeitura paga um determinado valor à marca e ela compra a produção das crocheteiras de Messias”, destaca George Almeida, coordenador do projeto. Inclusive, através dessa parceria com a Depedro, peça produzida por crocheteiras messienses já foi destaque na revista Vogue Brasil. 

George ressalta que em breve será instalada a loja das crocheteiras, um espaço onde cada uma delas terá seu ponto de venda. Além da loja, a Secretaria de Cultura planeja a formação de turmas para realização para cursos que serão destinados a quem tiver interesse em aprender a crochetar, tendo em vista a procura de mulheres interessadas em entrar no segmento. 

Mizaele Jales afirma que é do crochê que vem a principal ajuda no orçamento. A alta demanda pelas peças tem estimulado as mulheres a produzirem. “É uma fonte que eu posso contar. Além da parte financeira, esse projeto trouxe a oportunidade de novos aprendizados e novos projetos para minha vida. E quanto mais a gente se dedicar mais a gente vai ter retorno, principalmente financeiro. Posso dizer que tem sido muito importante o projeto e a intermediação da coordenação nas vendas, para que nossos produtos sejam valorizados e reconhecidos em outros lugares. Hoje nós temos uma boa demanda”, destacou Mizaela.  

Na produção das peças algumas delas recorrem à internet para se atualizar das tendências de cores e modelos, mas o que importa mesmo é entregar o produto como o cliente quer. “O crochê me proporcionou a oportunidade de criar peças que nunca imaginei conseguir criar. Estimula a minha criatividade. Cada peça concluída, logo me vem a vontade de começar a produzir outra. Além disso, tem sido uma fonte que complementa o orçamento, conquistando minha independência financeira e autonomia, ajudando a realizar meus projetos. Sou apaixonada pela arte de crochetar e vejo a possibilidade de empreender através das linhas e agulhas”, disse a pedagoga e também crocheteira Gigriola Lima.

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Bordado como principal fonte de renda das mulheres em Timbaúba dos Batistas

O Seridó é uma região conhecida pelos bordados e é na cidade de Timbaúba dos Batistas que moram as principais bordadeiras do Rio Grande do Norte, as mulheres que são responsáveis por transformar o bordado em verdadeiras obras de arte.  

A arte de bordar atravessa gerações. A maioria das bordadeiras aprenderam com seus familiares, muitas delas ainda na adolescência. Uma prova disso é a história da bordadeira e, atualmente coordenadora do artesanato no Município de Timbaúba, Jailma Araújo Gomes. Desde os 12 anos que ela empreende na arte de bordar, trabalho que já aprendeu com sua mãe. Hoje, com 41 anos, esse trabalho é a sua principal fonte de renda, mesmo tendo tentado outros tipos de trabalho ela sempre concentrou seu talento no bordado. “Já tivemos até 3 gerações de bordadeiras na mesma família, mas atualmente só temos duas gerações, mãe e filha em boa parte das residências”, confirma. 

Segundo Jailma 80% da economia vem do bordado, e nos últimos cadastros foram registrados aproximadamente 800 bordadeiras mulheres, desse número, a maioria é de mulheres que são chefes de família, um fato que relaciona o trabalho artesanal à autonomia financeira das mulheres. 

O artesanato inclui diferentes tipos de trabalho. O bordado, especificamente, concentra uma sequência de mão de obra até o produto ficar pronto para ser comercializado. “Na cadeia produtiva do bordado temos o riscador, a lavadeira e a passadeira, que inclusive estamos com um número bem reduzido. Riscadores temos apenas 5, lavadeira 3 e passadeiras 6, sendo 3 do sexo masculino”, frisa Jailma. 

A comercialização dos produtos é feita por vários canais como as feiras de artesanato e pela internet. Os produtos variam entre cama, mesa, banho, enxoval para recém nascidos, roupas, redes entre outros. As entregas são feitas em todo o Brasil, mas é no município, na “Casa das Bordadeiras Iracema Soares”, que concentra a maior parte das ações, inclusive a comercialização. Para os que desejam encomendar via internet, no instagram @casadasbordadeiras tem os contatos pelos quais poderão ser feitas as encomendas. 

Foto: Jailma Araújo

“A Casa dá suporte desde oficinas e capacitações até as vendas dos bordados. Aqui temos uma lojinha onde são comercializados os bordados e recebemos também encomendas. Além da lojinha participamos de feiras de artesanato municipais e estaduais”, destacou. As principais feiras que as bordadeiras participam e que também são pontos importantes de comercialização são: FIART, FENEARTE, FAMUSE e a feira de Belo Horizonte. 

Jailma acrescenta que o apoio do Governo do RN às profissionais vêm principalmente na realização de feiras de comercialização através do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB), além disso, existem novos projetos que ainda estão em fase de planejamento. 

Assim como os outros segmentos, o artesanato também sofreu as consequências da pandemia. A escassez de matéria-prima, durante o período em que as fábricas paralisaram sua produção, e o aumento no custo da matéria-prima, foram os principais problemas enfrentados pelas profissionais, que somaram com a queda nas vendas dos produtos. Apesar dos desafios, Jailma acredita que a partir dos projetos que estão surgindo é possível alimentar boas perspectivas para os próximos anos.

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Paulina Chamorro e a difusão do protagonismo ambiental das mulheres

A força feminina tem sido finalmente reconhecida como importante elemento de restauração do planeta. Em todas as áreas, destacam-se histórias de mulheres que empenham anos de dedicação para defender causas globais. Não é de estranhar que os nomes de Malala Yousafzai e Greta Thunberg revelaram-se grandes referências ainda na adolescência. Há uma dor que se iguala. Essa urgência por respeito e restauração do planeta parece encontrar eco no mais profundo da alma feminina, violentada diariamente em seus direitos e valores.

No país, iniciativas como a da jornalista Paulina Chamorro dão visibilidade a pesquisadoras que lideram grandes projetos ambientais. O Mulheres na Conservação, concebido e realizado juntamente com o fotógrafo João Marcos Rosa, está em sua segunda temporada e tem repercutido em várias plataformas da mídia, esse trabalho de mulheres ainda pouco registrado. Paulina também é integrante da Liga das Mulheres Pelo Oceano, um movimento em rede de mulheres em prol da conservação dos mares. 

A Revista Matracas convidou Paulina para conversar com nossas leitoras, ávidas por conhecimento e motivação. 

MATRACAS –  Paulina, nosso público é prioritariamente de mulheres nordestinas do sertão. Que mensagem seus projetos podem levar a essa realidade?

PAULINA – Eu acredito que quando a gente evidencia a força e o protagonismo de mulheres à frente de projetos de conservação, que não necessariamente precisam ser acadêmicos, isso nos mostra que a gente tem caminhos. Caminhos que já foram abertos. A gente aprende também que temos mulheres que já estão na luta há um certo tempo trabalhando por isso. Então, além da inspiração e do exemplo, a gente percebe que já foi um terreno que foi aberto por essas mulheres, que passaram por tantos desafios quanto às vezes essa outra mulher que está lendo, ou acessando, ou que está vendo pelas redes sociais algum episódio da série, está passando. Então eu acho que a troca de informações, mas principalmente através da comunicação, evidencia o trabalho de mulheres e faz muito mais do que só o exemplo. Nos mostra que os desafios são comuns, e que a gente pode se ajudar mutuamente. 

MATRACAS  – De que forma é possível fazer parte dessa conservação do meio ambiente, mesmo morando em uma região tão desfavorecida? Como participar da luta?

PAULINA – Estando em regiões mais desfavorecidas, aí a gente tem a importância justamente do protagonismo feminino e a importância de a gente colocar a nossa luta à frente. Porque são as regiões menos favorecidas e justamente também as mulheres que são os principais atingidos, por exemplo, da injustiça climática. Ou seja: dos grandes impactos climáticos gerados pelo ser humano no planeta, as principais áreas afetadas são justamente essas desfavorecidas. Pra participar da luta? Acredito que seria continuar sendo resiliente, continuar trabalhando com o olhar no coletivo, porque são essas soluções que já vêm sendo desenvolvidas e desempenhadas por essas pessoas e nessas regiões especialmente – carentes de tantas coisas –  que é chamado hoje resiliência. A resiliência a tantos desafios e que vão se tornar piores. Mas acredito que a grande lição que a gente tem que aprender e compartilhar nesse caso, que é essa participação da luta, é mostrar esse censo do coletivo. De que uma luta não é só de uma região, é uma luta coletiva, de todos. 

MATRACAS – Mossoró, cidade sede da Matracas, é historicamente marcada pelo primeiro voto feminino da América Latina, por Celina Guimarães. Qual o potencial da consciência política para mulheres que já trabalham no campo, buscando recursos e atividades sustentáveis?

PAULINA – Eu acredito que o trabalho em campo e o empoderamento da mulher no campo – porque a gente sabe que aqui no Brasil e na América Latina ainda é um grande desafio; a gente ainda vê que mulheres não têm acesso a recursos para cuidar de sua terra, do seu roçado, ainda dependem, em algumas áreas, muito dos homens – temos uma luta sim feminista ainda no campo, mas ao mesmo tempo são exemplos que vêm do campo, de associativismo, que mostram como mulheres líderes – a gente tem líderes de reservas extrativistas, líderes de colônias de pesca hoje. Então como essa organização e essa visão feminina de futuro integrado para todos e todas pode ser um caminho que a gente tem que levar a partir de agora no planeta. E isso é uma consciência política; porque a consciência política não é a que leva à questão do partido. Ela é justamente apartidária. A que trabalha sobre os recursos, sobre direitos das pessoas, de acesso. A que trabalha com a democracia, ou que trabalha contra a injustiça social e ambiental. E a mulher hoje no campo e no litoral tem desempenhado um papel muito importante de liderança.

MATRACAS –  O que falta acontecer para que as mulheres sejam vistas com igual visibilidade em suas lutas?

PAULINA – Acredito que a gente está em plena luta. E essa é uma luta que nunca acaba. O que falta acontecer é que a gente consiga ter a igualdade de gênero. A gente poder ter, num espaço de discussões e de tomada de decisões, o mesmo número de homens e de mulheres. Eu acredito que a mulher enquanto base, com seu conhecimento e com essa luta, agora a gente precisa dar esse salto e exigir – já que metade da população ou um pouco mais é de mulheres – a gente precisa ver essa representatividade nas tomadas de decisão. Nos lugares de poder: tanto político, quanto da iniciativa privada. A liderança das mulheres é uma realidade que precisa chegar agora.

MATRACAS – Que conselho você dá para as jovens que nos leem e gostariam de saber fazer mais pelo lugar onde vivem?

PAULINA – Eu gostaria de dar o conselho de continuar se inspirando, de apoiar mulheres, de falar e de reconhecer o trabalho de mulheres. A gente não sabe a força que tem escondida numa palavra de apoio, num carinho, ou numa visibilidade que você dá ao trabalho de mulheres. Eu acho que quando a gente fala de ‘não soltar a mão de ninguém’, a gente está falando disso. Se a gente quer que nós mulheres tenhamos as mesmas possibilidades e cheguemos nos lugares de poder, a gente precisa começar entre a gente mesmo. Se valorizando, apoiando, dando a mão, conhecendo o projeto, dando força, ajudando. É um caminho coletivo; é um caminho de mãos dadas que é o futuro e o presente construído por mulheres. E é esse mundo que eu espero viver em breve.

Para conhecer mais e se inspirar:
https://linktr.ee/Paulinachamorro
Instagram:
@mulheresnaconservacao
@vozesdoplaneta.podcast
@ligadasmulherespelooceano
@pauli_chamorro
Podcasts:
Vozes do planeta
Mulheres na conservação
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SEAPAC e FACISA realizam oficinas com mulheres de comunidades rurais no interior do RN

Estimular a autonomia das mulheres das comunidades rurais, levar informações sobre diversos temas, promover engajamento nas relações sociais são objetivos de um conjunto de oficinas que vem sendo realizado a partir de uma parceria entre o Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos (SEAPAC) e a Faculdade de Ciências da Saúde do Trairí (FACISA/UFRN) nas comunidades rurais com as mulheres que são acompanhadas pelo SEAPAC. As oficinas estão sendo ministradas pelas estagiárias de Psicologia Comunitária e Ambiental da unidade acadêmica FACISA/UFRN, um trabalho que já vem sendo realizado pelas estudantes desde 2019, porém teve que ser interrompido em 2020 devido à pandemia, mas agora está sendo retomado presencialmente.

De acordo com a estudante de psicologia, Amanda Rezende, uma das que ministram as oficinas, as primeiras atividades desse projeto foram realizadas na comunidade rural Salgadinho, do município de Sítio Novo/RN, em parceria com o médico da família e comunidade da Unidade Básica de Saúde (UBS) do Município, com quem foi desenvolvida a pesquisa intitulada “Como as mulheres do campo constroem sua saúde? Estudo em uma comunidade no interior do nordeste brasileiro”, na qual abordaram a temática saúde, cuidado e adoecimento.

Na última semana, um conjunto de oficinas foi realizado com as mulheres da comunidade Serra Verde, em Lajes Pintadas – RN, com o tema voltado para a autonomia das mulheres no campo. O objetivo é chamar a atenção dessas mulheres para a importância que elas exercem na sociedade. “Esse ano nós nos vinculamos ao SEAPAC que acompanha cerca de 70 famílias das comunidades rurais do município de Lajes Pintadas/RN. Em parceria com o projeto de extensão “Mandacaru Consultoria” da FACISA/UFRN, nós realizamos as primeiras oficinas com as mulheres das famílias acompanhadas pelo SEAPAC”, explica.

Durante esse mês de dezembro, estão sendo realizadas as primeiras oficinas presenciais no formato de roda de conversa com essas mulheres. Estão participando, além das estagiárias de psicologia Amanda Rezende, Évilla Fernandes e Ana Beatriz Oliveira, um total de 14 mulheres, que estão distribuídas entre 3 comunidades acompanhadas pelo SEAPAC, que são Serra Verde, Malagueta e Catolé.

“Durante as oficinas, apenas mulheres participam, sem a presença de nenhum homem, o objetivo é garantir um espaço acolhedor para que elas possam buscar orientações, compartilhar suas vivências e fortalecer as redes de apoio dentro da própria comunidade. Neste momento, nosso objetivo é promover a reflexão e discussão das mulheres sobre autonomia, direitos e o papel que elas exercem na comunidade”, frisa.

Amanda ressalta que a tarefa delas nas oficinas é de mediar, uma vez que todo o processo é construído e direcionado pelas mulheres.  “Desde a escolha das temáticas até o momento da roda de conversa. Essas atividades têm estimulado o protagonismo das mulheres no seu dia a dia na comunidade, além de fortalecer o vínculo entre elas que são, geralmente, a única rede de apoio acessível, uma vez que a maioria dos serviços se encontra distante, nos centros urbanos”, destacou.

Para Amanda, a experiência de acompanhar o serviço e a realidade das comunidades rurais no decorrer do estágio possibilitam unir a teoria e prática, promovendo intervenções contextualizadas com a realidade dessas pessoas. “Assim, orientar essas oficinas tem sido uma experiência ímpar para nossa formação profissional, abordando diversos assuntos e conhecendo essas múltiplas experiências da vida”, finaliza.

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E o Futebol Feminino é Campeão

Ontem no Estádio do Corinthians, que já possui o nome fantasia, mas aqui vou chamar de Estádio do Corinthians, nem arena, nem arena com nome de indústria farmacêutica, foi realizada a Final Paulista Feminino. Ainda acredito no futebol da alegria, da diversidade, da inclusão, da popularização da FESTA, que não cabe naming rights.

O primeiro jogo da final do Paulistão ocorreu no Estádio do Morumbi e o público foi baixo para uma decisão. Não chegou a 5 mil pessoas, segundo Lucas Lins, que atravessa a cidade pelo seu time do coração. O São Paulo venceu a partida por 1×0 e foi para o segundo jogo com certa vantagem. As duas equipes foram impecáveis no campeonato e o Corinthians, invicto, perdeu apenas o jogo para o São Paulo. A equipe do Morumbi só havia perdido para o Corinthians nas fases classificatórias. É preciso ser dito que não há justiça no futebol, essa justiça abstrata que conhecemos por aí, mas a final se fazia “justa” às duas melhores equipes disputando o título.

A garoa rasgando a carne num verão típico da cidade de São Paulo, mas as crianças se fizeram presentes, famílias inteiras, avós, netas, irmãs, amigas. É impensável numa final de campeonato masculino que esteja presente uma família com dois adultos e três crianças, por exemplo. Sem exageros, a conta seria no mínimo uns 500 reais. Ou seja, ver famílias inteiras no estádio é cena rara no futebol masculino espetacularizado. Imagine no futebol feminino. Mas vi mulheres demostrando amor ao seu time e afeto a suas companheiras, os casais de mulheres eram maioria no setor onde assisti à partida. As tradicionais torcidas fizeram-se presente, davam o tom da festa, incentivavam e não fizeram distinção ao gênero. Era o time do coração, da vida da história daquelas(es) que ocupavam a arquibancada. É preciso ser dito que há tempos estamos vivendo a lei do rei pelado. Isto é, nos jogos entre times da mesma cidade, os famosos derbis, não se permite torcida das duas equipes. É torcida única. E como em todo jogo de torcida única, lá estavam as(os) infiltradas(os), torcedoras(es) do time rival, segurando o grito, a raiva, a alegria, em silêncio, se fazendo invisível, pra que ninguém notasse o que estava estampado na alma.

O jogo começou com as jogadoras do São Paulo apáticas, era o frio, a torcida, a pressão de uma final, não sei, mas só deu Corinthians. Além dos dois gols de Gabi Zanotti, teve bola na trave e uma defesa incrível de Carla. Corinthians dominava a partida, porém estamos falando de uma final de campeonato e, aos 45 minutos do primeiro tempo, o São Paulo marca pelos pés de Naná.

No telão a narradora anuncia, temos na torcida a skatista Rayssa Leal, corintiana. Com sua família no camarote, a adolescente corria entre as cadeiras e uma sala que compõe o camarote. Ninguém havia notado a campeã. Após o anúncio, os pedidos de foto para quem estava próximo foi inevitável. Eu, como uma criança que pede um doce, acenava das cadeiras inferiores. Mas não, ela não me viu. Eu clamei apenas por um aceno, mas não fui notada.

Roberta Pereira

Começa o segundo tempo e o São Paulo voltou imbatível. O gol deu ânimo à equipe, que atacou e chutou mais ao gol e nos lembrou que estávamos num clássico!!! O jogo ganhava ares dramáticos, se terminasse 2×1 teríamos PENALTIS, SIM pênaltis! Aquilo né, não é caixinha de surpresas nem sorte, a galera treina muito, mas na hora de bater são muitas variantes em jogo e aqui não estamos falando de máquinas nem robôs, são seres humanos, então de fato tudo pode acontecer.

Jogo se arrasta, jogadoras exaustas nas duas equipes, cãibras e desgaste físico, estamos em dezembro do segundo ano de pandemia. Mesmo as atletas podem dizer, “fora do storys”, ninguém tá bem. Ponto importante o condicionamento físico das atletas está muuuuuito superior ao de anos atrás, mostra das melhores condições de trabalho, isso não foi opinião somente dessa colunista eufórica, mas das(os) corintianas(os) Rafaela e Henrique. Para não dizer que não falei das desigualdades, certamente isso se aplica a times maiores e com mais estrutura, visto que há equipes que não possuem o mínimo para a prática do futebol.

O jogo em campo e o coração na chuteira deixavam as(os) torcedoras(es) em agonia. Entre insultos, a juíza era xingada no masculino, e gritos de é Jogo da Vida é Sangue no Olho é Tapa na Orelha, o jogo ia chegando ao final. E de novo aos 45 minutos Adriana marca para o time do Povo. No telão a hasteg #respeitaasminas.

41 mil ingressos trocados, a entrada era gratuita, os ingressos encerraram três dias antes da partida. Público presente: 30 mil pessoas numa quarta-feira fria. Em campo juízas. No jornalismo mulheres (repórteres), não sei como foi a transmissão, mas imagino que foi narrado e comentado por uma mulher. Mas na direção, dois técnicos à beira do campo. Eu quero festa, quero gol e quero mulheres em todos os espaços e funções. Posto isso, o Futebol Feminino foi Campeão, um jogo histórico com recorde de público.  Eu, que sou de arquibancada, afirmo: um recorde de público diverso, de público inclusivo.

Em tempo, sim o Corinthians foi campeão e levou a tríplice coroa. Em 2021 a equipe feminina foi Campeã Paulista, Brasileira e da Libertadores.

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Márcia Eurico fala sobre sua pesquisa e livro “Racismo na Infância”

 

Os danos psicológicos decorrentes da violência racista vivida na primeira infância são invisibilizados, mas o fato é que essa violência marca a história das crianças e adolescentes negras para toda a vida. O racismo, desde as expressões mais explícitas às mais sutis, chega nas crianças negras logo na primeira infância e, apesar da gravidade social que essa realidade sustenta, o debate ainda é tímido.  

Para falar sobre o racismo na infância, recorremos à pesquisadora e assistente social Márcia Campos Eurico, autora do livro “Racismo na Infância”, publicado pela Editora Cortez e lançado em 2020 (link da live de lançamento – https://www.youtube.com/watch?v=e3f_-taoshQ), que debate a intersecção entre racismo e infância. Uma obra essencial, fruto de sua tese de doutorado, e que já é referência quando precisamos dialogar sobre essa questão e os impactos dela na vida das crianças e adolescentes negras. Um livro que chegou dando voz às crianças negras que são silenciadas em suas vivências, focando no racismo estrutural e institucional.  

O racismo na primeira infância e juventude ainda é pouco discutido. Essa é uma constatação de Márcia que é professora, mestre e doutora em Serviço Social pela PUC-SP e pós-doutoranda pela PUC-RJ. Segundo ela, a obra tem uma proposta de ser um instrumento de trabalho que possa levar a sociedade a pensar em como estamos vendo as crianças negras, com uma proposta de ampliar o debate sobre essa realidade, considerando que há um silêncio que permeia a violência racial na primeira infância e que isso tem consequências graves.  

O livro nos chama a atenção para o fato de que as crianças e adolescentes negras institucionalizadas precisam muito mais do que os cuidados práticos e objetivos. Ela enfatiza que “é preciso que essas crianças sejam vistas como sujeitos em totalidades, que precisam de afeto, de atenção, que tem deveres, mas também vontades”. Essa observação da pesquisadora baseia-se, entre outras constatações em relação ao sistema da política de assistência, nas constantes declarações que ouviu durante o processo de pesquisa: a de que as crianças nesses espaços estão seguras porque  têm comida, têm um teto, têm uma cama para dormir, o que para a pesquisadora é importante, porém “é o mínimo que essas crianças precisam ter”.

Foram várias inquietações que motivaram a pesquisadora. Questionamentos como: “por que crianças e adolescentes negras são as mais institucionalizadas no Brasil? Por que elas têm menos possibilidades de adoção?” Umas das questões recorrentes é que as famílias não querem crianças negras. Segundo Márcia “uma parcela expressiva de famílias ou de candidatos e candidatas à adoção, no momento de preencher o formulário, o cadastro de adoção, elas referem que não querem uma criança negra, mas que muitas vezes aceitam uma criança parda, como se a criança parda não portasse essas mesma negritude”, frisa. 

A partir dessa realidade, a professora começou a questionar “como é que essas essas crianças se sentem vendo outras crianças chegarem e partirem, ou de volta pros seus lares ou pra uma família adotiva, e essas crianças estão ali de alguma maneira e silenciosamente, percebem que elas estão ali por conta da cor da pele, por conta da sua origem  racial. esse foi o disparador”, conta.  

A pesquisa foi feita em duas instituições de acolhimento em São Paulo, com quatro equipes, durante oito meses. A metodologia utilizada foi a Grupo Focal, com o grupo operacional dessas instituições, profissionais dos serviços que são executados diretos com as crianças, tendo em vista que estes eram os que tinham maior vivência e relação de proximidade com essas crianças e adolescentes. Foram ouvidos profissionais de todos os níveis de atendimento e, a partir do conhecimento do cotidiano dessas instituições, dos relatos dos entrevistados, a pesquisa conclui que, entre outras falhas na política de assistência, falta debate racial, falta formação dos profissionais no sentido de que, nem todos os profissionais que chegam as instituições de acolhimento estão preparados para cuidar de uma criança e de um adolescente que tiveram situações de violência, de abandono, de negligência ou que foram invisibilizadas pelo racismo e caíram no serviço de acolhimento institucional. “Falta verba para pensar o cotidiano e estrutura mínima, falta espaço para ser escutado enquanto profissional”, acrescenta. 

Para Márcia foram realidades duras de ouvir e constatar. Com o cuidado de deixar claro que o livro não tem a intenção de desqualificar o trabalho exercido pelas instituições de acolhimento, ela reforça que a ideia é contribuir com o debate em torno do cuidado na infância e adolescência, ampliando a dimensão racial e de gênero. 

“A violência racial atinge todas as faixas etárias, mas a criança e o adolescente são pessoas em desenvolvimento, que precisam de afeto, que exigem o cuidado do adulto. Quando o cuidado vem recheado de preconceito, de discriminação, de descaso, em relação a esse corpo, por ser um corpo negro, a gente não faz ideia das dores que vão sendo produzidas na trajetória dessa criança e desse adolescente”, destaca. 

Márcia afirma ainda que, a importância de se discutir a violência racial na infância está relacionada ao fato de que todas as outras discussões como, encarceramento na juventude, ato infracional, medida socioeducativa, medidas de internação são debates que precisam considerar o racismo na infância.  

O título vem mostrar o quanto a sociedade está errando no cuidado com uma criança negra, quando se percebe, conforme explica a pesquisadora, que o mesmo direito que uma criança branca tem de permanecer pouco tempo na institucionalização, a criança negra também tem. Márcia enxerga essa realidade, a partir de seus estudos, que a estrutura racista continua vendo os corpos da criança e adolescente negros como são corpos que suportam a dor. 

A obra também aborda a questão de que as famílias mais punidas pelo sistema de garantias de direitos são as famílias negras e, conforme ressaltou, os sujeitos mais punidos são as crianças e os adolescentes negros. 

A pesquisadora finaliza dizendo que a análise do racismo é fundamental para que se entenda que racismo não é bullying. “As duas formas de violência precisam ser coibidas, rechaçadas, mas o racismo tem mecanismo de letalidade, de destruição, da vida, não só da morte, porque produz marcas”, diz.  

 Sobre a autora e o movimento #MarciaFica

Márcia Eurico, mulher preta e periférica, é referência no debate sobre a questão racial pela sua trajetória de pesquisa. Atualmente é professora na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Campus da Baixada Santista, e recentemente recebeu o prêmio Benedicto Galvão, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-São Paulo), que dá destaque à obra o “Racismo na Infância”.  

Em 2018 a PUC-SP ficou ocupada pelos alunos por quase uma semana, no movimento intitulado #MarciaFica! A mobilização reivindicava a permanência da professora no Curso de Graduação em Serviço Social, ao denunciar como o racismo institucional está impregnado nas universidades. 

O movimento trazia à tona a dura realidade de que o Curso de Serviço Social nunca teve em seu corpo docente uma professora (o/e) efetiva (o/e) negra (o/e) em seus mais de 70 anos de existência.

 

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Mulheres com deficiência relatam dificuldades na acessibilidade quando precisam dos serviços básicos de saúde

Os serviços de atenção básica a saúde, a maioria, são utilizados pelas mulheres. Nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), por exemplo, o público feminino prevalece entre os usuários desses equipamentos. No entanto, muitos desses serviços oferecidos não foram pensados para todas as mulheres. Uma realidade que, infelizmente, existe em todo o país e afeta, também, quando estamos falando de saúde privada e não somente do Sistema Único de Saúde (SUS). 

A revista Matracas conversou com três mulheres com deficiência, cada uma com necessidades específicas. São vários os dramas enfrentados por elas para realizar um simples exame de prevenção. Situações de constrangimento, dificuldades de acesso a determinados aparelhos, acesso a portas de entradas são problemas comuns na vida das mulheres com deficiência quando estas precisam dos serviços básicos de saúde. Situação que, para essas mulheres, significa enfrentar uma dupla vulnerabilidade.

Yascara Samara, filósofa, tem mobilidade reduzida. Ela disse que o problema começa pelo despreparo dos profissionais de saúde que não sabem lidar com as diferenças. Em seguida vem a decadência da estrutura. “Se um deficiente auditivo precisar se dirigir a uma UBS, vai ter que ir acompanhado, pois ninguém sabe a linguagem de sinais (libras). Além disso, a sinalização é falha. Para as pessoas com deficiência visual não é diferente, não existe acesso por meio de pisos táteis, sinalização em relevo nas portas. Eles acabam necessitando de um acompanhante”, disse. 

Com base nos relatos dessas mulheres, as pessoas com deficiência são as que têm que se adaptar às estruturas que são oferecidas nos equipamentos de saúde, ainda que estejamos falando de serviços de atenção básica. “A acessibilidade é o problema mais crítico, pois os cadeirantes, pessoas com mobilidade reduzida como eu, e idosos se aventuram ao tentar subir numa maca. Se levarmos acompanhantes, eles nos ajudam a subir, nos colocam nos braços como criança.  Os equipamentos são velhos, não regulam a altura e o problema existe nas cadeiras de dentista e na maca ginecológica. Eu ainda consigo subir um pequeno degrau, para ter acesso à maca, mas muitas vezes tive que chamar uma pessoa para ajudar a subir”, conta. 

A realidade não é única das UBSs, mas em clínicas e hospitais, sejam públicos ou privados. “Na sala de raios-x, por exemplo, os mamógrafos não se ajustam ao tamanho da cadeira. É uma situação de total falta de empatia e invisibilidade de nós pessoas com deficiências. Apesar de existirem muitos profissionais com deficiência ainda não somos consultados para uma melhoria nos serviços de atenção básica e saúde”, desabafa. 

Situações constrangedoras são comuns. “Outro dia fui fazer um exame ginecológico e a cama era muito alta, o aparelho da médica não conseguia me alcançar. Foi muito constrangedor, tiveram que chamar a atendente para ajudar a me colocar numa posição que desse certo acontecer o exame”, conta.  

Como se não bastasse uma realidade que já é difícil de encarar, Yascara fala dos retrocesso em lei da acessibilidade, referindo-se ao projeto de lei 2505\2021, que revoga um artigo da lei brasileira de inclusão que obrigava os gestores públicos a cumprirem a exigência de requisitos de acessibilidade. 

Sobre mudanças necessárias, Yascara elenca que “falta informação em suas formações, fazer pesquisas de campo, entrevistas, conhecer nossa realidade e trazer melhorias no atendimento, não só para nós mulheres com deficiência, mas também fazer os alunos que vão trabalhar na área aprenderem mais sobre a vivência das pessoas com deficiência. Colocá-los em uma cadeira de rodas, tapar seus ouvidos, vedar seus olhos e fazer de conta que são deficientes para que se tenha mais respeito, sensibilidade e um atendimento mais humanizado. A maioria considera a deficiência como algo distante, mas todos são suscetíveis a se tornar uma pessoa com deficiência, devido a acidentes ou doenças”, diz. 

Yascara acrescenta que em quase todos os espaços em que precisou passar foi necessário essa adaptação e mesmo que possam contar com algumas mudanças, existe omissão por parte dos poderes públicos de todas as esferas, e concorda que muitas coisas ainda precisam ser modificadas. 

“Aos poucos algumas mudanças foram sendo construídas. Na faculdade por exemplo, as rampas de acesso só foram colocadas depois que cadeirantes conseguiram entrar na faculdade, cotas de acesso para entrada, cotas no mercado de trabalho, lei de inclusão nas escolas, mas tudo muito deficitário e suado para conseguir. Por esses motivos, considero sim, muita omissão por parte dos representantes. Ninguém facilita não. Até para carteirinha de transporte público, estacionamentos, provas de concurso a gente precisa provar que tem sua deficiência. A cada seis meses tem que renovar, como se um dia você fosse amanhecer sem ela. É desumano você ficar correndo em busca de um laudo para provar o que não precisa ser provado. Os médicos chegam a se irritar com as idas e vindas aos consultórios para pedir estes atestados e laudos, e muitos nem dão, quando são dá área pública. Penso que seria muito importante um cadastro único para quem tem deficiências permanentes para que não necessite esse sofrimento de provar todas as vezes que tem uma deficiência. Ninguém nos ouve”, explica. 

Lília Campêlo tem sequelas de paralisia cerebral. Ela reconhece que não sofre dos mesmos problemas de um cadeirante, por exemplo. Mas como alguém que é integrada às discussões relacionadas à acessibilidade, ela também se indigna com a forma como as necessidades das pessoas com deficiências são enxergadas. “Nada é pensado em relação a nos atender de maneira adequada, fazendo com que a minha condição enquanto mulher com deficiência seja vista como alguém que esteja sempre precisando da ajuda do outro”, relata. 

Uma mulher com deficiência precisar de um serviço de atenção básica nas Unidades de Mossoró é enfrentar desafios e constrangimentos. “Deitar em uma maca para exames de qualquer espécie é algo simples para quem não tem deficiência. No entanto para mim é algo que necessito sempre de ajuda, em razão da altura da maca ser de um tamanho padrão de forma que não me dá autonomia de subir e descer por conta própria, por ser uma mulher com deficiência nos membros inferiores”, destaca. 

 Ela reforça que tanto o sistema público quanto o privado não dispõe dos serviços adequados para elas. “Os dois sistemas não distinguem o atendimento de uma pessoa com deficiência de outra que não a tenha. Nesse sentido, somos nós, pessoas com deficiência, que temos que nos adequar ao que nos é oferecido”, frisa. 

Lília também reconhece a omissão dos gestores.  “Certamente, de modo até generalista, digo que nunca conseguimos ocupar nossos lugares de maneira natural, sempre nos fizeram acreditar que, por sermos “minorias”, não há a necessidade de adequação dos espaços comum a todos enquanto indivíduo social’, relata.

As situações expostas por essas mulheres apontam para uma necessidade urgente de transformação, tanto nas práticas profissionais quanto na estrutura física dos equipamentos. “Acredito que, em primeiro lugar, precisamos ser vistas como mulheres que estão dentro da mesma sociedade, assim como as demais, que usufruem dos mesmos direitos de atendimento médico que têm as outras pessoa. Inclusive, esse é um dos princípios da dignidade da pessoa humana, que não é levada em conta se essa é ou não uma pessoa com deficiência”. 

Ela acrescenta que a omissão dos gestores é uma revolta que carrega todos que precisam de um serviço de saúde diferenciado. “A gestão pública tem a sua parcela de culpa, principalmente no que diz respeito à acessibilidade da mulher com deficiência aos serviços básicos de atendimento médico. Embora seja usado pela maioria da população, não vejo qualquer projeto que nos acolha de modo especial, dando a devida importância às nossas diferentes necessidades, muitas vezes nos tornando incapacitadas de receber um atendimento de qualidade.  Não visualizo avanço que nos faça acreditar que existe igualdade no atendimento a saúde da mulher com deficiência”, expressa.

Camila Morais, assistente social e palestrante educacional, também tem mobilidade reduzida. Para ela a ausência da visita do agente comunitário de saúde é um problema. Sempre que busca por um agente, recebe a orientação para ir até a UBS. Apesar dos diferentes tipos de deficiência, alguns problemas elas sofrem em comum: a questão da maca para exame ginecológico e quando precisam fazer serviços odontológicos.  

“O meu primeiro exame ginecológico não teve como ser feito na UBS, foi feito na minha casa. Outra vez, precisei ir ao dentista, o profissional fez o atendimento no meu próprio equipamento de locomoção, precisando ficar em uma posição desconfortável, mas efetuou o serviço pois viu que eu não poderia acessar a cadeira convencional que a UBS tem”, afirma. 

Sobre a sexualidade das mulheres com deficiência, a saúde sexual e reprodutiva, ela afirma que é preciso lidar com o despreparo dos profissionais, começa pela forma de abordagem. “Alguns profissionais, durante a consulta, não fazem referência ao atendimento a mim e sim ao meu/minha acompanhante, isso já mostrando uma percepção diante deles que não posso responder aqueles questionamentos e noto receio quando vão fazer perguntas em relação à atividade sexual, traduzindo uma ideia, ainda bem compartilhada, que nós, pessoas com deficiência, não podemos ter relações sexuais”, aborda. 

Lília, Yáscara e Camila concordam que existe um desinteresse em demandas consideradas específicas das pessoas com deficiência. Camila diz que já deixou de realizar exames por dificuldade no acesso aos equipamentos, isso tanto no SUS quanto na rede privada. “Quando vou fazer exames oftalmológicos, preciso de adequações durante todo o exame. Sempre preciso sentar no colo de alguém ou levar de casa algo que possa me deixar em uma altura maior para a realização desse exame”, explica. 

A visão correta de quem elas são seria um passo de mudança social, considera Camila.  Elas lutam para que sejam vista antes de pessoas com deficiência, como pessoas, principalmente, como mulheres. “Como qualquer outra cidadã, temos direitos e deveres. Devemos fazer esse trabalho de conscientização, ou seja, de que nossas deficiências são uma condição e não devem nos resumir somente a elas”, frisa.

Todas discutem e se indignam por serem invisibilizadas. “Há avanços, mas precisamos sempre estar reivindicando, alertando e mostrando que estamos aqui e somos usuárias de todos os espaços. Não é um favor e sim, um direito. Precisamos nos conscientizar e conscientizar as demais pessoas que somos cidadãs legítimas de direitos, como todas as outras”, finaliza Camila. 

 

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Coletivo Negras encerra ciclo do Encontro Formativo de 2021 abordando a obra de Angela Davis

O Coletivo Negras – Núcleo de Estudos de Gênero, Relações Étnico-Raciais, Aprendizagens e Saberes do Semiárido, vai estar concluindo, nesta sexta-feira (26), o ciclo de Encontros Formativos do semestre 2021.

O próximo e último encontro desse ano vai abordar a temática Mulheres, Raça e Classe, inspirada na obra de Angela Davis, e terá como facilitadora a professora da Ufersa, Auristela Crisanto da Cunha.

Auristela explica que os encontros formativos e palestras do grupo são sempre voltados à pauta inclusiva e respeito à diversidade, com preponderância da temática negra, que é a razão primeira do projeto. “De minha parte, farei uma apresentação sobre Angela Davis, em Mulheres, Raça e Classe”, frisa.

Segundo Ady Canário, professora da Ufersa e coordenadora do projeto, o Encontro de novembro, conclui o ciclo que foi iniciado antes da pandemia com o estudo de autoras negras, a partir do olhar das participantes do Coletivo Negras. Apesar de ter sido adaptado a um novo formato, Ady destaca que o projeto foi imenso e bem recepcionado.

“Os encontros foram mensais e adaptados ao remoto. O balanço é positivo por afirmar um espaço interdisciplinar e estendido a escola e comunidade, dando visibilidade às mulheres negras e suas próprias leituras e partilhas”, disse.

Ao longo dos encontros foram trabalhadas autoras como Djamila Ribeiro, Carla Akotirene, Joice Berth, Bell hooks, Chimamanda, Sandra Petit, Vilma Piedade e, por último, Angela Davis.