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Educação no Brasil: mero discurso político

Se há um instrumento eficaz e capaz de transformar a sociedade, esse instrumento é a educação, isso é fato e de fácil comprovação, basta observar exemplos de países como a Noruega e Finlândia, que ao investirem parte de seus recursos financeiros na formação de professores, nas condições estruturais de suas escolas, na remuneração salarial dos profissionais de educação entre outras medidas, obtiveram como recompensa o desenvolvimento de suas nações, ocupando assim, as primeiras posições no ranking mundial de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Há nesse sentido, duas visões de mundo que divergem entre os governantes dos diversos países sobre como gerir a educação de um povo: a primeira é encarar a educação como um gasto, uma despesa, e a segunda é vê-la como investimento.
Aqueles que veem a educação como gasto não a priorizam como relevante para a população e não enxergam o retorno vultoso que a mesma proporciona em um futuro próximo.
Ao contrário daqueles que compreendem os gastos em educação como um investimento, investem no desenvolvimento intelectual de seu povo que retribuem o investimento com a qualificação do trabalho contribuindo, consequentemente com o desenvolvimento do seu país.
É importante ressaltar ainda que, os países que enxergam a educação como investimento não se desenvolvem apenas economicamente, mas também eticamente e do pondo de vista do exercício da cidadania, pois desde cedo e de sempre se instrui e se forma cidadãos com conhecimento das múltiplas disciplinas e de seus direitos e deveres sociais através de investimento na qualidade da educação, o retorno também se apresentará através de menores índices de violência, mais tolerância, respeito, equidade, justiça social, qualidade de vida…
Aqui no Brasil, infelizmente, a visão de mundo sobre educação para muitos dos nossos representantes políticos é a de que a educação é um gasto e não um investimento. Para comprovar essa tese, podemos usar um fato real que ocorre todos os anos em muitas cidades e estados brasileiros: a luta dos professores pelo cumprimento da Lei do Piso Salarial Nacional do Magistério.
Embora a Lei 11.738 tenha sido sancionada em 2008 e prescreva a regulamentação do piso salarial do magistério público da educação básica, desde que a lei foi sancionada, todos os anos há uma polêmica por parte dos órgãos federativos que anualmente alegam não terem condições financeiras para cumprir a lei ainda que a mesma apresente complementação financeira através da União segundo os critérios da lei.
Lamentavelmente mais uma vez a CNM (Confederação Nacional dos Municípios) orienta prefeitos a não concederem o pagamento do piso salarial do magistério, tal postura obriga profissionais da educação a lutarem pelo cumprimento da lei e do seu direito.
Ora, se os nossos representantes políticos descumprem uma Lei Federal, quanto mais se preocupam com o investimento e a valorização da educação no que se refere à melhoria da estrutura física das escolas, tecnologia, formação continuada de professores, realização de concurso público entre outras ações tão necessárias para uma educação realmente pública e de qualidade.
Enquanto a educação pública no Brasil não passar de um mero discurso político em época de eleição (em que propostas encantadoras são apresentadas e prometidas à população, mas que não são cumpridas pela visão limitada de educação como gasto ou pela má intenção de lucrar com a ignorância e miséria do povo) estaremos fadados a um país que nunca chegará a status de desenvolvimento, como bem disse Paulo Freire: “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”.
É preciso, portanto, que a luta pela educação de qualidade não seja apenas de professores, mas de toda a sociedade, pois o futuro promissor de qualquer nação inevitavelmente passa pela educação.
Paula Regina da Silva Duarte é Professora da Rede Estadual de Ensino, Mestre em Letras e Diretora de Juventude do SINTE/Regional de Mossoró.
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Uma conversa sobre mulheres rurais e o novo governo Lula, com Michela Calaça

Michela Calaça, é da coordenação do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e integrou a equipe de transição no GT do Desenvolvimento Agrário.

 

Falta pouco para o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumir a presidência. No início de dezembro, 32 grupos temáticos de transição estiveram em Brasília para dialogar, apresentar dados e propostas que servirão de instrumentos para a gestão do próximo governo. 

Os relatórios elaborados pelos grupos temáticos da equipe de transição de governo já foram entregues. Em suas redes sociais, no dia 13 de dezembro, o presidente eleito diz: “quando decidi ser presidente da República outra vez, assumi um compromisso com o povo de devolver a eles seus direitos básicos. Todo brasileiro tem direito a comer, morar, estudar e trabalhar, ter oportunidade e ser feliz. Essa é a causa da minha vida”. Em seguida, Lula anuncia que estava encerrando o trabalho de 32 grupos técnicos do Gabinete de Transição.  

De Mossoró, participou da equipe de transição no GT de Desenvolvimento Agrário, Michela Calaça, da coordenação do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC). Ela diz que o presidente Lula desde do início apontou que gênero, raça/etnia e geração são elementos fundamentais para reconstrução do Brasil. “Mas como nós mulheres sabemos, as mulheres precisam sempre lutar mais para que suas pautas, seus modos de pensar e contribuir com a realidade sejam vistos e, mais ainda, aceitos e implementados”, explica que inicia com essa reflexão porque “é assim na sociedade em geral e, na pauta agrária, parece ser um pouco pior. Mas é impossível ignorá-las: mesmo as mulheres sendo as que menos tem terra, são as que tem a produção mais diversificada, com grandes contribuições na agroecologia e defesa do território e da natureza. Por outro lado, são as mulheres negras e rurais as que estão em maior situação de vulnerabilidade social, sendo as que mais passam fome”. 

Michela frisa que, as mulheres não foram a maioria das nomeações “o que disse acima talvez ajude a entender porque, mas fomos maioria no dia a dia da construção do trabalho, e, com certeza, conseguimos dar grande contribuição técnica e política a todo esse processo”, completa.        

A política de governo para o campo, desde o golpe, tem produzido resultados devastadores. Os cortes nos recursos destinados a programas de fortalecimento da produção de alimentos pela agricultura familiar, à educação do campo, como também a devastação da natureza, impactaram diretamente a vida das mulheres rurais. O governo Lula representa a construção de um novo cenário, pois já definiu que a pasta será reestruturada por considerar fundamental para o enfrentamento da fome no país e para construir um desenvolvimento Agrário inclusivo, social e ambientalmente sustentável.

Segundo Michela Calaça esse ministério é muito importante para as camponesas, mas é mais que isso: “Na vida das mulheres camponesas, que são mulheres diversas e que estão no campo, na floresta e nas águas, esse ministério é fundamental, pois é a partir de políticas públicas voltadas a construção de autonomia econômica que as mulheres rurais conseguem ver seu trabalho valorizado, suas experiências produtivas e sociais sendo ampliadas. Mas o mais importante é o que esse ministério representa para todo o povo brasileiro. É a agricultura familiar quem mais produz alimento nesse país, e na agricultura familiar o papel destacado é o das mulheres. A missão do presidente Lula, colocada por ele mesmo e delegada pelo povo, é o fim da fome de forma estrutural, ou seja, é a construção de volta da a soberania alimentar e para isso um ministério que invista na produção de alimentos saudáveis de forma descentralizada, como é a agricultura familiar, criando política pública de abastecimento popular é fundamental”, explica.  

Calaça destaca ainda a importância da agroecologia enquanto caminho que pode efetivamente acabar com a fome, a partir da construção de um processo de soberania alimentar. Ela começa dizendo que “a soberania alimentar pressupõe acesso à terra e defesa do território e da natureza, como também se coloca como uma ferramenta de unidade entre quem produz e quem consome, não em nome de uma lucratividade, mas em nome do bem viver de todas e todos. Digo isso, porque agroecologia não é uma técnica de produção, ela ao ser ciência, movimento e prática como técnica e modo de vida, ela possibilita pensar produção, distribuição e consumo para todas e todos, com defesa da natureza”.  

A insegurança alimentar tem se agravado no Brasil nos últimos anos. A fome se tornou um dos principais e mais graves problemas que o Brasil enfrenta atualmente. O trabalho de transição apontou que a falta de ação do atual governo no sentido de priorizar a vida do povo nos levou a isso. Mas o governo Lula já surge tendo como forma de ação o dialogo com os movimentos sociais o que aponta para construção de saídas coletivas. 

Michela afirma que esse diálogo, que envolve entre tantos grupos, as entidades que compõe a Via Campesina e o campo unitário, vem desde a construção do programa de governo do presidente eleito. 

“Nós apresentamos ao presidente Lula, ainda na construção do programa antes da campanha, uma plataforma unitária do campo, floresta e água, para desenvolvimento do Brasil e enfrentamento da fome. Essa plataforma orientou, de certa forma, a construção do programa da chapa Lula e Alckmin nesse tema, e agora na transição, as organizações do unitário indicaram pessoas para participar da transição, uma delas aqui do nosso Estado, a companheira Josana Lima da CONTRAF, como também nós que militamos na pauta do feminismo e da agroecologia estávamos na transição contribuindo com esse debate”. 

Mulheres no Desenvolvimento agrário e as rurais no Ministério das Mulheres 

A participação das mulheres, com esse ajuste ministerial, na pasta do Desenvolvimento Agrário, e das mulheres rurais no Ministério das Mulheres, também, foi pauta exposta no GT. 

“Nós, mulheres feministas e agroecológicas atuamos para construção de um rural com igualdade. Nós pautamos a existência de um espaço específico para construção de políticas públicas para as mulheres no novo ministério. Que tenha capacidade de executar políticas especificas e que também possa ajudar a transversalizar em todas as outras pastas. Temos um grande desafio que é termos mais mulheres à frente dos ministérios. Ao percebermos que as indicações para o MDA eram apenas de homens, conduzimos um grande debate a partir do GT de Mulheres da Articulação Nacional de Agroecologia e apontamos o nome da Maria Fernanda Coelho ex-secretária executiva do MDA (antes do golpe), ex-presidenta da Caixa Econômica, e que atualmente está no Consórcio Nordeste atuando na pasta da agricultura familiar e na da assistência social.  Conseguimos construir um grande consenso entre as mulheres devido a enorme capacidade técnica e política da Maria Fernanda”, destacou.

São as mulheres rurais protagonistas na produção de alimentos, além de garantir a soberania e segurança alimentar. Apesar disso, vivem em um contexto de desigualdade social, política e econômica. Uma realidade que mudará com a presença das mulheres rurais ocupando esse ministério.  

Michela destaca que nos governos Lula e Dilma já existia espaços voltados as mulheres rurais no Ministério das Mulheres. No momento nesse momento mulheres das organizações do campo, floresta e águas tem pautado que precisa ter um espaço mais estruturado, com possibilidade de execução de ações próprias, mas que também ajudem as políticas públicas de combate à violência entre outras implementadas por esse ministério a chegar nos diversos espaços rurais.

Apesar das consequências marcadas pelos retrocessos do governo Bolsonaro, especialmente quando se fala em políticas públicas para as mulheres, as organizações e movimentos de mulheres, esperam que essa construção de uma nova gestão com a participação direta de quem conhece a realidade de cada setor de perto, resulte em mudanças significativas.    

As vozes das agricultoras familiares que trabalham com agroecologia chegaram aos espaços de debate do GT do Desenvolvimento Agrário de várias formas. Segundo Michela “com representação direta, várias indicadas, eu, Célia Watanabe, Beth Cardoso, Sarah Luiza, Josana Lima entre outras. Temos como referência de atuação a agroecologia e o feminismo a partir das mulheres camponesas e essa foi nossa linha política e técnica dentro do GT”.

 

 

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Maternidade Almeida Castro registrou 1.055 partos prematuros entre novembro de 2021 e outubro de 2022

O número de crianças que nascem antes da 37ª semana de gestação, ou seja, prematuras, no Brasil, é alarmante. Uma realidade para a qual chama atenção a campanha Novembro Roxo, que tem 17 de novembro como o Dia Mundial da Prematuridade. A campanha desse ano trouxe como tema global “Garanta o contato pele a pele com os pais desde o momento do nascimento”, tendo em vista que esse modelo de cuidado, de contato, passando pela oferta de leite materno, fortalece o vínculo mãe e filho e ajuda na recuperação do bebê. 

Dados do Hospital Maternidade Almeida Castro, fornecidos pela coordenação geral de enfermagem, mostram que Mossoró e região seguem esse alto índice de nascimentos prematuros. Entre novembro de 2021 e outubro de 2022, foram realizados 1.055 partos de bebês prematuros. A coordenadora geral de enfermagem da Almeida Castro, Patrícia de Oliveira, disse que esse número corresponde aos partos de mulheres de Mossoró e região. Ela frisa que a maternidade realiza em torno de 600 a 650 partos por mês de Mossoró, sendo que 65 municípios são atendidos pelo hospital.  

A maternidade conta com 17 leitos de UTI Neonatal, 18 leitos de canguru e 15 leitos na Unidade de Cuidados Intermediários (UCIN). Normalmente estes leitos estão no limite de ocupação. 

A pediatra Regina Célia Fernandes, que atende na Maternidade Almeida Castro, fala sobre os tipos de casos da prematuridade, mostra dados estatísticos e destaca os principais cuidados para evitar. É considerado um recém-nascido prematuro as crianças abaixo de 37 semanas de idade gestacional. Estima-se que no Brasil uma média de 12% (entre 10 e 15%) dos 3 milhões de nascidos vivos ocorrem antes da gestação completar 37 semanas. Isso, de acordo com dados da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). 

Regina explica que entre as RNs prematuros existem: pré-termo tardio, entre 34 semanas e 0 dias, e 36 semanas e 6 dias; o pré termo moderado (ou moderadamente pré-termo), 32 semanas e 0 dias, e 33 semanas e 6 dias; muito pré-termo de 28 semanas e 0 dias, a 31 semanas e 6 dias; pré-termo extremo, menor que 28 semanas e 0 dias.

“As causas que levam ao trabalho de parto prematuro podem estar vinculadas a doenças obstétricas e ginecológicas. Podemos citar a doença hipertensiva na gestação, diabetes gestacional, história prévia de trabalho de parto prematuro, que aumenta quatro vezes o risco para TPP, doenças uterinas, como miomas, malformação uterina, insuficiência do colo do útero, infecções urinárias ou corrimentos na gestação, quando não tratados corretamente”, elenca. Acrescentando que, uma das principais formas evitar é realizando um pré-natal de forma adequada e rotineira.

Brasil ocupa o 10ª lugar no ranking mundial de nascimentos prematuros

De acordo com o Sistema de Informações Sobre Nascidos Vivos (Sinasc), do Ministério da Saúde, o Brasil está entre os países onde mais nascem prematuros. Um dado preocupante, pois a prematuridade é a principal causa de morte nos RNs e a principal causa de morte em crianças até os cinco anos de idade, no mundo. 

“O impacto ocorre não apenas para a criança, mas também para toda família. Para criança aumenta o risco de problemas no crescimento, neurológico, respiratório, na visão, audição, atraso motor, problemas de comportamento e diminuição do aprendizado. Para a família ocorre um impacto emocional gigantesco”, destaca Regina Célia. 

Para enfrentar essa realidade são muitos os desafios. Inclusive, para os hospitais maternidades. Conforme explica a pediatra, a luta começa antes mesmo do nascimento de um bebê prematuro. “Tudo começa com uma boa assistência pré-natal para todas as famílias, em especial, para as famílias carentes, que têm pouco acesso a saúde de qualidade. Em seguida, um bom modelo assistencial na maternidade, principalmente voltado para o acompanhamento do prematuro com pessoal qualificado e treinado para esses RNs e trabalho de humanização dos profissionais e equipe multiprofissional. Finalizando, o acompanhamento ambulatorial desses bebês para modificar positivamente seu prognóstico”, destacou a pediatra. 

A médica fala ainda da perinatologia, conceito integrador da obstetrícia e pediatria neonatal com enfoque na abordagem dos principais problemas de saúde da mulher durante a gravidez, o parto e puerpério, e da criança, na vida fetal e neonatal, como períodos evolutivos e indissociáveis. “Sua aplicação no cenário clínico tem como principal objetivo fornecer subsídios clínicos interdisciplinares para promoção, prevenção e identificação sistemática dos problemas para tomada de decisões na assistência à saúde materno-fetal e neonatal. A redução de mortes potencialmente evitáveis e de complicações da prematuridade demanda aplicação do conhecimento cientificamente evidenciado, além da organização dos fluxos assistenciais ao longo da gestação e período neonatal”, ressalta. 

Para além de todos os cuidados técnicos e humanizados, existem os avanços científicos e tecnológicos que têm possibilitado maiores taxas de sobrevida neonatal. Para Regina, ainda há muitos desafios para a assistência ao RNPT, tais como: gestação não planejada, altas taxas de cesarianas, déficit na formação de profissionais de saúde aptos a lidarem com a família durante a internação do recém-nascido na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN), baixo investimento financeiro, estrutural e de recursos humanos em programas de acompanhamento ao recém-nascido prematuro após a alta, e ainda fatores socioeconômicos maternos, como é o caso do baixo índice de escolaridade materna, menor idade materna. 

São muitos os riscos que um bebê prematuro enfrenta, e a idade gestacional é o que mais conta quando se fala em sobrevivência. “Quanto menor a idade gestacional maior é o risco de mortalidade. Essa porcentagem vai depender de cada serviço com grande variabilidade no Brasil. 

“Prematuros de 22 semanas, pesquisas têm mostrado taxas de sobrevivência de 2% a 15%; prematuros de 23 a 25 semanas, a taxa de sobrevivência é entre 15% e 40%; 25 semanas é em torno de 55% a 70%; prematuros de 26 a 28 semanas, as taxas de sobrevivência são de 75% a 85%; prematuros de 29 a 32 semanas, a taxa de sobrevivência é entre 90% e 95%. de 33 a 36 semanas, a taxa de sobrevivência é maior do que 95%”, mostra.

Existe todo um processo de tratamento para sobrevivência do bebê. “A utilização de corticoide antenatal, incubadoras e respiradores adequados, uso de surfactante melhoraram a sobrevida dos RNs prematuros. Além disso, protocolos para o recebimento do RN prematuro, preparação de toda equipe para realizar a reanimação nos bebês, melhoraram a mortalidade nessa faixa”, frisa. Para isso, todo o trabalho que envolve a sobrevivência de um prematuro, é feito em conjunto hospital/pais. Isso contribui para um resultado mais rápido na recuperação dos bebês. 

“A assistência neonatal humanizada estimula o desenvolvimento físico e emocional do bebê, reduz o estresse, a dor e o choro do recém-nascido; estabiliza o batimento cardíaco, a oxigenação e temperatura do corpo do bebê; ao ouvir o som do coração e da voz da mãe, o bebê fica mais calmo e sereno; aumenta o vínculo mãe-filho; favorece o aleitamento materno; contribui para a redução do risco de infecção hospitalar; proporciona maior confiança dos pais nos cuidados com o bebê e contribui para a otimização dos leitos de UTI. O programa é uma das medidas que complementam o cuidado integral de bebês, assim como a Rede Cegonha – estratégia que oferece atendimento humanizado à saúde das mulheres e crianças até dois anos na rede pública com acompanhamento do pré-natal, parto e puerpério”, explica. 

A presença dos pais na recuperação é fundamental 

No período de internamento o vínculo entre a família é fortalecido, e os bebês que são acompanhados respondem mais rapidamente aos estímulos dos pais, o que auxilia no amadurecimento e equilíbrio da vida da criança, além de acelerar sua recuperação. 

Para essa ligação, a medicina conta com o método canguru, que por definição, trata-se de um modelo de assistência ao recém-nascido prematuro e sua família. O método é voltado para o cuidado humanizado que reúne estratégias de intervenção biopsicossocial. O bebê prematuro é colocado em contato pele a pele com sua mãe ou com seu pai. 

São três etapas que compõe esse método. “A primeira inicia-se no pré-natal na gestação de alto risco e, após, na internação do recém-nascido prematuro na Unidade Neonatal. Os pais devem ter livre acesso à unidade, sendo que os estímulos ambientais prejudiciais da unidade neonatal, como ruídos, iluminação e odores devem ser evitados. Na segunda, o bebê permanece de maneira contínua com a mãe e a posição canguru deve ser realizada o maior tempo possível. A mãe participa ativamente dos cuidados do prematuro, e deve estar apta para colocar o bebê na posição canguru. Na terceira etapa, o bebê vai para casa, após a alta hospitalar. O bebê retorna para ser acompanhado, de 48 a 72 horas, por uma equipe de profissionais, juntamente com sua família, no ambulatório”, apresenta a pediatra. 

Ser mãe de um bebê prematuro é lidar com o medo e a insegurança 

Quando uma mulher engravida o que ela mais deseja é uma gravidez tranquila e que o bebê venha com saúde. Tudo isso, claro, dentro do tempo esperado de uma gestação normal, no caso numa gestação completa que varia entre 37 e 42 semanas. Ou seja, ao mesmo tempo em que a mãe conta os dias para o nascimento do filho, ela não quer que ele venha antes desse tempo. No entanto, nem sempre as coisas saem como programado, como é o caso dos “apressadinhos” que chegam antes do previsto e, nessa situação, há uma grande batalha a ser enfrentada. 

Seja prematuro extremo, seja aqueles que nascem numa fase mais segura, há sempre uma angústia e medo. Sara Maria nasceu em 15 de junho de 2022, com 34 semanas e pouco mais de 2kg. Antes disso, a mãe,  Gigriola Lima, já vinha de um processo de idas e vindas ao hospital devido à problemas de hipertensão gestacional. Ou seja, antes do parto, ela já convivia com o medo de ter a filha antes do tempo. Sara nasceu no dia 15 de junho e recebeu alta hospitalar no dia 25 do mesmo mês.   

“Ter um filho prematuro nos coloca diante de um desafio para o qual não estamos preparados. A gente lida com o medo, a insegurança, principalmente, com o medo de haver alguma intercorrência que traga complicações para o bebê que já nasce em condições tão frágeis. A vivência no hospital, mesmo com todo o acolhimento, também não é fácil. E quando a gente presencia a situação de outras mães que as vezes é mais dramática que a nossa, a gente fica apreensiva”, disse. Gigriola afirma que foram dez dias difíceis, mas para a felicidade de toda a família correu tudo bem na recuperação de Sara.

Direitos das mães que tem bebês prematuros 

A advogada Heloísa Souza, esclarece sobre os principais direitos das mães e dos bebês prematuros. Um assunto que ainda não é muito discutido, talvez pelo fato da prematuridade ainda ser um tema que não tem tanta visibilidade. São direitos que os pais e familiares precisam ter conhecimentos para que não lhes sejam negados. 

Segundo Heloísa, garantir esses direitos cumpre o dispositivo 7° do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual estabelece que “a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”. 

Sobre os direitos das mães de bebês prematuros estão garantidos: acompanhar o bebê durante 24 horas no espaço neonatal. De acordo com a advogada, a Lei considera que nesta situação a mãe não é visita. Além disso, nos casos em que a mãe ou o pai não puderem acompanhar filho, eles podem ser substituídos por algum responsável. 

“Outra garantia que precisa ser do conhecimento de mães que tem filhos prematuros é a licença maternidade, que só começa a contar da alta hospitalar da mãe e do bebê. Nos casos em que ocorrem em datas diferentes, conta-se aquele que for dado por último”, frisa.

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PL de Marleide Cunha instituiu o Dia Municipal de Tereza de Benguela e da Mulher Negra

A vereadora Marleide Cunha (PT) conseguiu aprovação de um projeto de grande importância histórica e social. Na sessão ordinária da última terça-feira (01/11), foi aprovado o Projeto de Lei que institui o Dia Municipal de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, na data de 25 de julho. 

Tereza de Benguela, líder quilombola, se tornou heroína para o povo negro do país, principalmente para as mulheres. A data é uma oportunidade para trazer à tona temas como o racismo, o machismo e a opressão de gênero que ainda estão em pauta e tem consequências maiores sobre a vida das mulheres negras. 

Nacionalmente o dia 25 de julho foi decretado em 2014 como Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, pela presidente Dilma Rousseff, com o objetivo de celebrar a vida e a luta de Tereza, reconhecida por liderar o Quilombo de Quariterê por mais de duas décadas. Por todo significado que a data representa, todo ano, o mês de julho é de memória, luta e reconhecimento para mulheres negras, e isso acontece por meio de várias atividades. 

Para Marleide, por vivermos em uma sociedade racista, machista e excludente, a luta e a resistência das mulheres negras sempre foram invisibilizadas pela história. Somando a isso, avaliando o contexto atual, a grande maioria das mulheres negras vive em situação de vulnerabilidade, pois são as que mais sofrem desigualdade no Brasil.   

“Instituir no calendário oficial do Município de Mossoró o Dia Municipal de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, é uma forma de preservação da nossa memória histórica e de reconhecimento da luta das mulheres negras líderes de resistências. Lutas estas, de bravas, corajosas guerreiras negras, são ignoradas, apagadas, pela história brasileira. Principalmente, devido a um racismo que encontra na misoginia um mecanismo de silenciamento. E nós precisamos apagar esse silenciamento, precisamos combater esse apagamento histórico dessas lutas. Por isso, a lei é importante, ela simboliza e reforça a luta das mulheres negras pela promoção da igualdade racial no Brasil e ajuda a gente a se reconhecer e conhecer a nossa história”, destaca a vereadora.     

A jornalista, pesquisadora e mulher negra, Pâmella Rochelle, destaca que a aprovação dessa PL a nível municipal, reforça a Lei instituída no Brasil pela presidenta Dilma Rousseff e contribui diretamente para um movimento de visibilização da história e das pautas das mulheres negras que ainda hoje são as mais afetadas pelo racismo e preconceito.

“Conhecer a história de Teresa de Benguela é conhecer a própria história do Brasil e das mulheres negras, tendo em vista que Teresa, conhecida como rainha Teresa, líder do Quilombo do Piolho, é um símbolo de resistência e luta contra as opressões raciais e sociais. Acredito que a PL contribui diretamente para que a população mossoroense não esqueça a história de luta e resistência do povo negro, como também que se fomente discussões étnico-raciais na sociedade de modo geral, levando os sujeitos a manterem uma atitude antirracista”, disse.

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Coletivo Negras da Ufersa realiza Seminário de Educação e Antirracismo

O projeto de extensão Coletivo Negras da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), está com inscrições abertas para o I Seminário de Linguagem, Educação e Antirracismo, que acontecerá nos dias 24 e 25 de novembro. O Seminário dispõe de 100 vagas, que garantem a certificação integral de 15 horas. As inscrições podem ser feitas até o dia 1 de novembro por meio do SIGAA.

O tema “Mulheres Negras, Sociedade e Educação Antirracista”, divide-se em três eixos de discussões com as contribuições da comunidade interna e externa. De acordo com Pâmella Rochelle, jornalista, pesquisadora e uma das organizadoras do evento, este é o primeiro Seminário de Educação e Antirracismo de Mossoró. Ela fala da importância do seminário e destaca a participação da conferencista Matilde Ribeiro, doutora, escritora de literatura negra e professora na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afrobrasileira (UNILAB – Ceará).

“Com esse Seminário nós do coletivo NEGRAS desejamos fomentar a discussão racial tanto no âmbito acadêmico, educacional, como na sociedade de modo geral. Tendo em vista que a construção de uma sociedade mais justa e igualitária passa tanto pelas questões de gênero como de raça/etnia”, frisa.

Matilde, militante do movimento negro e do feminismo, tem uma trajetória de luta registrada. Foi Ministra Chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Brasil, durante o Governo Lula e é reconhecida pela sua importância nas lutas pela implantação das políticas de igualdade racial no Brasil. Durante o evento, a professora abordará a temática “Saberes populares e acadêmicos: linguagem, educação e antirracismo”.

A conferência de abertura do evento será no formato online, no dia 24, e será transmitida pelo canal oficial da UFERSA no Youtube. No dia 25 a programação segue de forma presencial, no Auditório da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC), localizado no Lado Leste do Campus de Mossoró. Pela manhã, a partir das 7h30, haverá a exibição do documentário Solo Negro e o lançamento da cartilha “Combate às Práticas de Racismo em Tempos de Pandemia”. À tarde, a partir das 13h:30, acontecerão rodas de “Linguagens Extensão, Discursos e Práticas Decoloniais” com três diferentes eixos: I “Racismo, inclusão e Juventudes Negras na Educação e Mídia”; II “Gênero, Diversidade Sexual e Violências Múltiplas”; e III “Justiça, Autoestima, Mulheres Negras no Campo e Cidade”.

Apoiam a atividade os Grupos de Pesquisas GEPEDS, Observatório do Semiárido e GEFOR, através dos estudantes e professores do Curso de Licenciatura em Educação do Campo e construção de parcerias.

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Jéssica Mendes fala sobre a 2ª edição da Feira Bangalô 

Consolidar uma marca no mercado em meio a um cenário de grande competividade não é tarefa fácil, principalmente, quando estamos falando de empreendedores que não dispõe de tanta estrutura de marketing para que possa tornar a sua marca conhecida e, consequentemente, ampliar as vendas de seus produtos. As redes sociais são, atualmente, um espaço que tem facilitado a divulgação de uma marca ou empresa, no entanto, nem sempre é suficiente quando o objetivo é ampliar vendas e fidelizar clientes. 

Foi pensando em para além das vendas virtuais que surgiu em Mossoró a Feira Bangalô, uma iniciativa da empreendedora Jéssica Mendes, que já podemos considerar que deu certo. Prova disso está na adesão que vem tendo a segunda edição da feira que acontecerá no próximo sábado (08/10) na Cervejaria Cabocla, a partir das 16h. 

O evento se tornou destaque na cidade enquanto espaço para empreendedores e empreendedoras exporem seus produtos. Durante a exposição os visitantes podem comprar os produtos que estão à venda e ainda contam com várias atrações musicais locais, enquanto durar a feira.  

O crescimento do evento, especialmente em termos de número de participantes, registrado de uma edição para outra, já mostra o sucesso da ideia. Na primeira edição foram 32 expositores. Nesta, já são em torno de 50 inscritos. “A Feira Bangalô surgiu com o intuito de promover os empreendedores que estavam apenas no virtual, inicialmente prevalecendo o segmento do artesanato. Mas o projeto foi tomando forma, passou a agregar outros segmentos e, ao mesmo tempo, foi se alinhando a cultura de Mossoró. Hoje a feira promove arte, comércio e cultura local”, destaca.

A Bangalô vem atendendo o propósito que é impulsionar as vendas dos que atuam como micro empreendedores e torná-los conhecidos no mercado. Através de um evento que reúne cultura, música, exposição de uma variedade de produtos e comidas artesanais, a feira oportuniza, também, uma interação direta entre o empreendedor e o cliente. Uma interação que ultrapassa apenas o virtual, o que é uma grande vantagem para os pequenos empresários.  

Até o momento estão inscritos em torno de 50 expositores. Deste total, 90% é das inscrições são de mulheres. A idealizadora da Feira acredita que até lá podem haver novos inscritos, considerando que diariamente tem surgido interessados em participar.

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Peças que vêm do barro e o talento que atravessa gerações

O artesanato em barro, trabalho que em grande parte nasce dentro dos ambientes familiares e vai passando de geração para geração, por muito tempo foi visto apenas como um trabalho para sobrevivência e não como uma arte. No entanto, essa habilidade de transformar barro em peças, sejam peças utilitárias ou peças decorativas, passa a ser vista por uma outra perspectiva, ou seja, como uma arte e, naturalmente, os artesãos uns verdadeiros artistas.

Podemos dizer que o Rio Grande do Norte é um Estado que se destaca no artesanato e, nesse segmento, destacam-se os produtos de barro como uma riqueza da nossa cultura. No Nordeste, inclusive no RN, são muitas as famílias que seguem a tradição da produção desses artigos.

Itamara Almeida, militante do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), formada em Letras pela Uern, e doutoranda pela UFPB, vem de uma família que trabalha com a produção de peças de barro em Assú. Segundo ela, a atividade na família atravessa várias gerações, e nem os mais velhos conseguem dizer quando foi iniciado esse trabalho na família. Embora a atuação da família nessa arte carregue uma longa história, um tempo incontável, pode-se dizer, ela começou a produzir, de fato, em 2015, inspirada no trabalho do seu tio que morava próximo de sua casa, e que veio a falecer em 2017.

Ela conta que passou a frequentar mais a calçada do tio, espaço onde ele realizava seu trabalho, e foi se aproximando de tudo que envolvia o barro e suas obras. Passou a conhecer mais sobre todo o processo de produção, fazia os registros das peças que seu tio produzia, e procurou entender sobre o processo de feitura das peças, desde a queima do barro até o produto final.

“O meu tio faleceu em 2017 e deixou toda a argila dele para mim. Então, esse foi um momento forte da minha vida. Foi quando comecei a me apropriar mais disso, comecei a fazer um outro tipo de produção, diferente do que a minha família produzia, que era a produção de objetos mais artísticos, mais decorativos e menos utilitários. Minha família sempre produziu potes, panelas, alguidares, coisas que estão ligadas ao uso no cotidiano. Eu buscava uma produção ligada a elementos mais artísticos, que poderiam decorar ou expressar alguma coisa que eu estava sentindo”, destaca.

Itamara acrescenta que começou a fazer material com barro entre 2015 e 2016. “Apesar da minha família fazer isso há muitas gerações, a minha mãe foi parando de fazer, meus tios, as minhas tias, porque era uma lembrança penosa da vida delas e deles, da família como um todo”, frisa. Acrescentando que o sofrimento enfrentado para produção dos artigos foi um dos motivos que levou a família a deixar a produção de lado.

“O processo de pegar o barro longe, a pé, tudo isso trazia uma memória para minha mãe especial muito forte de uma condição de miséria. E minha mãe sempre dizia que não ia me ensinar a fazer porque eu tinha que estudar, então fui sendo privada dessa coisa de produzir o barro”, conta.

O foco do trabalho de Itamara começou com a produção de peças decorativas, ou que emitissem sentimentos. Na sua produção, encontrou mais um desafio. Ela percebeu que a argila utilizada pela família não passa por um tipo de melhoramento, considerando que para a produção de um pote, por exemplo, não precisa de um melhoramento como precisa para produzir escultura.

Então, a partir daí, o processo foi de buscar melhoramento dessa argila, e estudar a composição “sobre qual a melhor argila, sobre como fazer a limpeza dela, sobre todos esses processos que, de alguma forma, poderia me ajudar a ter uma qualidade, mais condições de produzir outros materiais, como as esculturas”, explica.

Mesmo que tenha direcionado seu trabalho à produção de peças diferentes do que sua família costuma produzir, Itamara deixa claro que a intimidade com a produção de peças em barro está ligada ao modo que sua família faz.

“Minha família trabalha com uma técnica totalmente manual sem a utilização de ferramentas muito elaboradas, ou materiais que são adquiridos via compra. Todo o material da produção vem do que elas mesmas fazem, são ferramentas disponibilizadas no seu próprio espaço. Elas mesmas que produzem. Não tenho dúvida que parte das minhas escolhas para o futuro tem a ver com a argila e parte dessas escolhas tem a ver com o quanto é significativo para minha família essa produção”, disse.

Retornando à produção das peças sob outra perspectiva 

Itamara afirma que sua mãe (Damiana de Souza) e sua tia (Francinete de Souza Araújo) voltaram a fazer as peças com muita vontade e muita força. “Atualmente elas estão fazendo parte da equipe que está trabalhando na repaginação do Mercado da Agricultura Familiar de Natal. Elas trabalham com a produção de potes, vasos grandes, que serão utilizados na repaginação do mercado, por meio de um projeto via governo”.

O diferencial desse trabalho atual vem de que, para a família de Itamara a produção com argila, de artigos utilitários, sempre teve o sentido de sobrevivência, ou seja, não era visto como a produção de uma arte, mas como uma forma de produzir para sobreviver. No entanto, o trabalho que sua mãe e sua tia fazem hoje para a repaginação do Mercado da Agricultura tem outro significado. “É diferente de fazer um pote para vender e comprar um almoço. E isso contribui para uma visão diferenciada, com mais positividade, de um trabalho tão bonito e tão significativo”, frisa.

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Vereadora diz que bancada da situação dificulta andamento de projeto voltado para mulheres vítimas de violência

A vereadora Marleide Cunha há mais de um ano vem tentando colocar em votação um projeto de lei que busca instituir reservas de vagas para mulheres vítimas de violência doméstica e vulnerabilidade social nos processos de licitação das empresas contratadas pelo Município de Mossoró. Mas, segundo ela, os vereadores da bancada da situação vêm dificultando o andamento do projeto.

Na sessão desta terça-feira (28/06), a vereadora teve mais uma tentativa frustrada. Segundo Marleide a sessão foi esvaziada para não haver a votação no projeto. “A bancada da situação não tem interesse. Hoje conseguimos as assinaturas para o requerimento de urgência, porque precisamos de oito assinaturas. E nós temos essas oito assinaturas, juntando a bancada da oposição e independentes. Conseguimos as assinaturas e o projeto ia entrar em pauta para ser votado, mas todos os vereadores da situação que estavam no plenário, saíram para não dar quórum. Então, não entrou em votação porque a sessão foi encerrada por falta de quórum”, disse.

Nesta quarta-feira (29), Marleide vai tentar mais uma vez colocar o requerimento de urgência para ser apreciado. “Espero que amanhã ele seja aprovado. Precisamos dar condições as mulheres para que elas possam romper com o ciclo de violência. Sabemos que sem oportunidade de trabalho elas vão continuar se submetendo a situações de violência”, frisa.

O projeto foi protocolado em 1º de março de 2021. Em junho ele foi rejeitado pela Comissão de Constituição Justiça e Redação (CCJ) com o argumento de que era inconstitucional. Marleide explica que antes da votação da Comissão foi encaminhado um parecer dos advogados mostrando que o projeto não era inconstitucional, já que este não altera os critérios de licitação.

“Continuam os mesmos critérios, que é o de menor preço, melhor técnica e melhor técnica e preço. Então ele não interfere nesses critérios. O projeto apenas destina 5% das vagas para as mulheres vítimas de violência nas empresas terceirizadas do município”, explica.

Mesmo a CCJ tendo rejeitado o projeto, a vereadora não pediu arquivamento. O passo seguinte foi entrar com um substitutivo pedindo novamente avaliação do projeto.

Ainda de acordo com Marleide não há motivos para impedimento. Ela acrescenta que um projeto semelhante a esse, de um vereador da situação, foi aprovado e sancionado ainda em 2022. Foi o Projeto de Lei que trata sobre reserva de vagas de emprego destinadas aos egressos do sistema prisional e sistema socioeducativo nas empresas que tem contrato de prestação de serviço com o Município de Mossoró. Projeto que, inclusive, contou com o voto favorável da vereadora, por considerar a importância dele.

“Essa Lei já existe, é a 3947 de maio de 2022. Ela foi aprovada e sancionada esse ano. Enquanto o nosso projeto que estava desde o ano passado foi rejeitado. Se para as mulheres vítimas de violência era inconstitucional, porque que esse projeto que reserva, também, vagas de emprego para egressos do sistema prisional não foi considerado inconstitucional?”, questiona a vereadora.

Marleide disse que na sessão desta terça-feira a bancada da situação tinha a minoria em plenário, apenas seis vereadores. Essa minoria foi orientada a sair da sessão. No caso, esvaziaram o plenário Genilson Alves, Raério Araújo, Wiginis do Gás e Edson Carlos, ficando apenas os da mesa diretora.

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Escritora Ana Cláudia Trigueiro fala sobre o livro “Deep Blue”

A Psicóloga e escritora potiguar, Ana Cláudia Trigueiro, conversa sobre o seu 9º livro “Deep Blue”, obra voltada para o público juvenil, porém é leitura recomendada para todas as idades pela importante reflexão abordada no título. 

Dedicada a leitura desde os seis anos de idade e apaixonada por literatura, Ana Cláudia tem sua marca registrada no universo da escrita feminina no Rio Grande do Norte, sendo hoje um dos principais nomes da literatura potiguar. Com várias publicações disponíveis, ela escreve contos, crônicas, romances históricos e, no momento, vem trabalhando a divulgação do Deep Blue, seu último trabalho que, como ela mesma afirma, é uma das suas maiores paixões enquanto escritora.  

No Deep Blue a psicóloga vai abordar, entre outras temáticas, a solidão dos adolescentes, uma história contada a partir da personagem Safira, uma das mais marcantes na escrita autora ao longo de sua jornada literária. Segundo Ana os jovens e adolescentes tem sido a principal inspiração quando a ideia enquanto escritora é contar histórias. 

O livro conta a história de Safira, uma adolescente que está vivendo um momento muito turbulento na vida dela. Focando numa abordagem que envolve a adolescência e seus problemas, na história, a menina se coloca numa situação arriscada sem perceber que está correndo riscos. A metáfora, conforme explica a autora, é que ela se torna amiga de um tubarão branco, e na narrativa o tubarão branco representa os perigos que estão se aproximando dos jovens, como a questão da dependência química, as redes sociais que nem sempre são confiáveis. 

“Safira é uma das personagens mais intensas da minha jornada como escritora. A jovem canoísta de 15 anos me fez pensar sobre o quanto a adolescência é delicada e desafiadora. Pensei em uma menina com as características iniciais de uma anti-heroína, que amadurece ao longo do tempo a partir de experiências dolorosas. Há um processo de crescimento emocional que culmina em redenção”, destaca. 

Foto cedida

Sobre a história ela adianta que “Safira mora na Praia de Ponta Negra e ama passear com seu caiaque, remando todas as tardes em direção ao paraíso que fica por trás do Morro do Careca. É lá que conhecerá a criatura gigantesca que a levará às mais divertidas e perigosas aventuras. Não vou falar mais para não tirar do leitor o gostinho da descoberta”, diz. 

Um Tubarão de estimação

“O encontro inusitado com um tubarão-branco, metáfora para os perigos à espreita nessa fase da vida, vai trazer experiências impactantes à protagonista e ela as viverá em meio à dor causada por um trauma do passado”, destaca. A ideia de colocar um tubarão em cena, segundo a escritora, vem do fascínio pelo animal marinho. “Eles são enormes, poderosos, ferozes (para vocês terem uma ideia, são os animais que mais produzem testosterona em toda a natureza), portanto, indomáveis. Aparentemente Blue será “amigo” de Safira, mas a verdade é que servirá de alegoria aos desafios envolvidos no processo de amadurecimento”, explica.

Entre as várias questões, o Deep Blue vai tratar, também, do estilo de vida que a sociedade contemporânea dissemina, da relação dos jovens com os pais. “Nossos Jovens se angustiam por não conseguirem ser e realizar aquilo que as redes sociais alardeiam como sendo necessário para sua felicidade. Enredados nessa teia de consumo e propagação de conteúdos vazios, eles podem se perder. Como leitora precoce, acredito na literatura como fonte de apoio emocional e fonte de formação cultural, intelectual e moral. Além, é claro de diversão. Mas para que o livro se torne um hábito precisa haver condições favoráveis. Assim, Deep Blue deseja formar novos leitores oferecendo literatura atrativa e inspiradora”, ressalta.

O livro foi publicado através da Lei Aldir Blanc em setembro de 2021. O lançamento foi feito por meio de uma live do Clube de Leitura do Bolo de Chocolate, com a participação de adolescentes que leram o livro. Quem ficou curioso para conhecer a história de Safira, pode adquirir o livro pelo Instagram @deepbluebook, além disso, a obra vai estar à venda na Feira do Livro de Mossoró, edição 2022, no estande da Livraria Independência, da Artbook e da CJA.

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Maternidade compulsória e a pressão psicológica sobre mulheres que não desejam ter filhos

A ideia do “instinto materno” e da plenitude da maternidade ainda estão impregnadas na nossa sociedade. Mas, nem toda mulher deseja ser mãe e “tá tudo bem”, ou pelo menos deveria estar. O problema é que ser mulher e fugir da expectativa social é ter que lidar com julgamentos, e no caso da maternidade não é diferente. 

As mulheres que não querem ter filhos e até mesmo as que querem, mas ainda não planejaram estão cansadas de ouvir o “quem vai cuidar de você na velhice?”, “a mulher só conhece o amor verdadeiro depois que é mãe”, “você só vai se realizar como mulher depois que for mãe”. Isso, além de serem referenciadas como egoístas, frias, que não gostam de criança. As cobranças em torno das mulheres para que elas tenham filhos são muitas. No entanto, sobre gerar, criar, educar e até mesmo sobre a exaustão da maternidade, muitas vezes sem uma rede de apoio, pouco se fala.      

A pedagoga Mariana Brilhante, 44 anos, não tem dúvida de que a maternidade não faz parte dos seus planos. Ela afirma não sentir o famoso “instinto materno”. Não há uma razão específica que justifique essa decisão de não ter filhos, a não ser o fato de simplesmente não sentir vontade. 

Mariana Brilhante

“Não sou contra a maternidade e nem questiono mulheres que querem ter filhos, é um direito delas essa opção. Mas acho que quem não tem esse mesmo desejo precisa e deve ser respeitada. Acredito que maternidade foi imposta por uma sociedade que propaga a ideia de que a mulher só é mais mulher quando é mãe, e quem não tem filhos tem uma vida ruim, pois acreditam que a felicidade da mulher está ligada a um filho”, diz. 

Mariana conta que as críticas e opiniões, inclusive invasivas, chegam tanto de pessoas com quem ela não tem intimidade quanto de pessoas próximas. “Eu já ouvi de alguém que eu amo muito que eu sou infeliz e seca porque não tenho filho. Isso machuca muito, e não é verdade que somos menos sensíveis só por não querermos ser mãe. Eu já ouvi muitas mulheres que são mães dizerem que se pudessem voltar atrás nunca teriam tido filhos. Mas acredito que a sociedade trata dessa questão com muita complexidade e tabu”, frisa. 

As discussões sobre essa temática geram estresse para as mulheres, que não raro são expostas a situações constrangedoras. Ainda de acordo com Mariana, um comentário comum que sempre chega é que ela vai se arrepender de não ter tido filhos quando se deparar com a solidão na velhice. “Como se filhos fossem garantia de que não seremos sozinhas na finitude da vida. Se isso fosse regra, as casas de acolhimento para idosos não estariam cheias de pais órfãos de filhos”, destaca.

Ela desconstrói a ideia de que não querer ser mãe significa não gostar de criança. “Eu gosto muito de criança, amo minhas sobrinhas, meus alunos, fico com eles algumas horas, me apego, mas não sinto desejo de ser mãe e me angustia muito a forma como as crianças de hoje vivem. Eu não gostaria de ter tido filho na situação em que vivemos nessa última década. Tenho visto muitas crianças nascendo com transtornos, pais que precisam dedicar suas vidas exclusivamente aos filhos. Me conforta saber que não fiz essa escolha e quero ser respeitada por ela”, relata.

A assistente social Irys Cardoso Dantas, 34 anos, disse que ser mãe ainda não está nos planos, embora não descarte a ideia de um dia vir a ser. Porém, as cobranças e questionamentos chegaram desde que Irys pôs os pés “na casa dos 30”.  “Já tá na idade de ter filho” é o que ela mais escuta.

Os questionamentos não chegam acompanhados de uma avaliação sobre o contexto de vida da mulher, é como se ser mãe só dependesse da idade e do desejo. Comentários semelhantes aos que são direcionados à Mariana, Irys e a tantas mulheres que tomam a mesma decisão mostram o quanto a maternidade é vista quase como uma obrigação quando se é mulher. Inclusive, uma pressão social que não atinge os homens.  

Irys Cardoso Dantas

Irys defende que ser mãe não depende só de desejar ou cumprir com uma obrigação imposta, existem inúmeros fatores pelos quais ela ainda não pensa e nem deseja ter filhos. “Me perguntam muito quem vai cuidar de mim quando eu envelhecer. Ter filho não garante que teremos quem cuide da gente. Eu vejo no meu trabalho na área da assistência social muitos casos de abandono de idosos, mesmo os que têm vários filhos”, relata. 

A assistente social acrescenta que “a maternidade é uma responsabilidade muito grande e eu não me sinto preparada para criar e educar outra pessoa. Eu falo sempre: não sei cuidar de mim, imagina de uma criança. Mas muitas falam que a agente aprende com o tempo, que é um amor incondicional. Quero sentir um dia, mas não sem ter como dar subsídios a ela. Enfim, são muitos questionamentos que se passam na minha cabeça, não quero ter filho só por ter ou porque a sociedade diz que eu tenho que ter. Quero estar preparada, me sentir preparada para que eu possa ser a melhor mãe que eu puder”, diz.

 

Pesquisadora fala sobre a pressão em torno da maternidade 

A Revista Matracas conversou com a pesquisadora Ana Luíza de Figueiredo Souza (analuiza.dfigsouza) autora do livro “Ser mãe é f*d@!”: mulheres, (não) maternidade e mídias sociais”, sobre a maternidade compulsória. Ela explica de que maneira essa pressão foi estruturada na nossa sociedade e como ela atinge de uma forma ou de outra a todas as mulheres.

Ana Luiza Figueiredo Souza

Revista Matracas: O que significa maternidade compulsória? 

Ana Luiza de Figueiredo Souza: O mais importante é entender que a maternidade compulsória não se resume a um fator específico. Ela é um somatório de elementos (socioculturais, políticos, econômicos, médicos, religiosos, afetivos) que criam conjunturas que fazem com que a maternidade pareça — e, muitas vezes, se torne — a única opção possível para as mulheres. Essa compulsoriedade envolve desde macroestruturas (aquilo que se relaciona ao poder público, às políticas públicas, às esferas legislativa e jurídica, à maneira como nos organizamos enquanto sociedade civil, à cultura hegemônica, às representações midiáticas, ao imaginário coletivo) até microestruturas (aquilo que se relaciona à família, aos círculos sociais, aos relacionamentos afetivos, à construção subjetiva, ao planejamento de vida dos indivíduos), sendo que essas estruturas se perpassam. Por exemplo, um médico que, por crenças pessoais, se recusa a realizar a laqueadura de uma paciente ou a colocar um DIU em outra paciente. Uma família que, por estar inserida em um contexto maternalista, estimula a filha de oito anos a brincar de mamãe, desencorajando o interesse por algo além da maternidade.

 

Revista Matracas: Como ela afeta as mulheres na nossa sociedade. Não só as que não desejam ter filhos, mas também aquelas que apenas não consideram que seja o momento de ter, porém também sofrem a pressão social? 

Ana Luiza de Figueiredo Souza: A maternidade compulsória afeta a todas nós, de forma mais ou menos intensa. Tecnicamente, uma mulher que deseja filhos no futuro, mas acha que ainda não seja o momento para os ter, se mantém dentro da normatividade materna. Ela quer virar mãe, cumpre a expectativa normativa. Pode sentir uma cobrança mais interna, no sentido de querer algo que ainda não consegue realizar. Por sua vez, expressar a falta de desejo de se tornar mãe configura uma transgressão a essa normatividade. Apesar de a não maternidade ser mais aceita em determinados círculos sociais, não vem sem pressões ou agressões. Em geral, se entende que a falta de filhos precisa ser “compensada” de alguma maneira. Isso vale tanto para aquelas que não desejam ser mães quanto para as que ainda estão indecisas ou que esperam o melhor momento para isso. Já que elas não têm filhos, então “devem” estar disponíveis para atender às necessidades de pais/mães/responsáveis, ser maternais, saber lidar bem com crianças e adolescentes, entre outras demandas. O que não raramente se converte em fonte de novas insistências para que tenham filhos logo ou que mudem de ideia sobre permanecer sem eles.

 

Revista Matracas: Como a pressão social em torno dessa ideia de que a mulher tem que parir chega às mulheres lésbicas? 

Ana Luiza de Figueiredo Souza: Com mulheres lésbicas (e de outros grupos minoritários), se faz presente a necessidade de mostrar que podem ser mães tão valorosas quanto as mães preconizadas pelos modelos maternos hegemônicos. A imagem familiar tradicional — embora distinta do que sempre existiu ao longo da nossa história enquanto país —, consiste em um pai, uma mãe e seus filhos biológicos. Fugir disso, ainda que não seja incomum, gera preconceitos, violências, dificuldades. Percebo três tentativas vindas de mulheres que pertencem a grupos divergentes da norma, entre elas, as lésbicas. Uma é a de se aproximar, conscientemente ou não, o máximo possível daquilo que foi estabelecido como “ideal”, de comportamentos normativos. Outra é a de se distanciar desses modelos e seguir apenas aquilo que faz sentido para si mesmas (suas concepções do que seria uma mulher, uma mãe, uma família, criação dos filhos etc.), já que tais modelos não as acolhem. A terceira é a de negociar entre a normatividade materna e as preferências/possibilidades pessoais. Esta última acaba sendo a via percorrida por número expressivo de mulheres, sejam lésbicas ou não. Fato é que uma mulher lésbica pode ser mãe biológica (muitas, inclusive, investem altos valores para isso), ter os filhos por meio do parto, adotar e/ou exercer a maternidade solo. Uma experiência não impede a outra.

 

Revista Matracas: Como desconstruir essa ideia de que a maternidade é o meio de alcançar o ápice da vida das mulheres? Podemos relacionar essa cultura ao sistema patriarcal, capitalista?   

Ana Luiza de Figueiredo Souza: O capitalismo nasceu no patriarcado, mais especificamente o patriarcado branco. Portanto, é um sistema intrinsecamente misógino, racista, sexista. Além de predatório no que se refere ao impacto socioambiental que ocasiona. Verdade seja dita, o número de pessoas que se beneficiam da soma dessas mazelas é muito restrito. Se queremos combater a ideologia maternalista, a maternidade compulsória, temos que entender que esse empenho também precisa enfrentar as estruturas que as sustentam. Entre elas, a misoginia, o racismo, o sexismo e esse modelo socioeconômico que, além de utilizar e reforçar preconceitos e violências há muito enraizados, está levando o planeta ao colapso. Acredito que a luta perde muito quando a restringimos a uma só esfera de enfrentamento. Ou contra a maternidade compulsória. Ou contra a misoginia. Ou contra o racismo. Ou contra a degradação ambiental. Ou pelos direitos das pessoas com filhos ou pelos direitos das pessoas sem filhos. Não se trata de “ou”, mas de “e”. São demandas que caminham juntas. Se contempladas, construiriam uma coletividade mais justa, para todos os seres vivos. 

 

Revista Matracas: Sobre a romantização do que é ser mãe.

Ana Luiza de Figueiredo Souza: Nas nossas culturas e sociedades hegemônicas, que são patriarcais, ser mãe é colocado como aquilo que todas as mulheres deveriam ser, algo que nasceram para se tornar. Mesmo em culturas e sociedades fora desses modelos hegemônicos, a figura da mãe é valorizada, até reverenciada. A mãe é mais importante. É mais forte. É mais realizada. É digna de ser exemplo. Tem mais companhia. É mais sábia. Existe a crença generalizada de que ter filhos marca o amadurecimento da mulher, o que a transforma em uma adulta “de verdade”. Então muito da romantização do que é ser mãe vem da reprovação da vida enquanto mulher sem filhos, como se fosse menor. No entanto, essa romantização da maternidade guarda armadilhas. Em contextos patriarcais e misóginos, o valor feminino se dá na medida em que a mulher se torna útil a terceiros. Desempenha função servil. Não à toa aquelas que não viram ou não querem virar mães são o tempo inteiro interpeladas para que maternem. Então o que é valorizado é essa função servil, mais do que a mulher-mãe em si. Aí mora o perigo. Primeiro porque, mesmo sem filhos, se torna difícil escapar dessa lógica maternalista. Ela também engloba as não mães, existe a expectativa de que estejam à disposição de pais/mães e seus filhos. Segundo porque, se a maternidade é algo que todas as mulheres nasceram para desempenhar, “não precisam” de assistência do poder público nem da sociedade civil na maternagem, pois “já sabem o que fazer”. Se não sabem, “deveriam saber”, isso é um “problema só delas”. A maternidade acaba sendo tratada majoritariamente no campo individual, em vez de enquanto questão coletiva, que necessita de amparo do Estado. Também é tratada como uma espécie de bênção, pela qual as mães deveriam ser eternamente gratas, suprimindo críticas, reclamações, dores. E muito disso vem da romantização que a rodeia.

 

Sobre Ana Luiza 

Ana Luiza de Figueiredo Souza é mestre e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM UFF), sendo graduada em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda pela UFRJ. Gestora de Produção de Conteúdo e Editoração do GP Tecnologias e Culturas Digitais da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). Coordenadora da equipe de revisão da revista Contracampo. Integrante do grupo de pesquisa MiDICom. Consultora acadêmica e literária. Autora do livro “Ser mãe é f*d@!”: mulheres, (não) maternidade e mídias sociais. O livro apresenta e expande os principais resultados de sua pesquisa de mestrado, vencedora do Prêmio Compós. Seus trabalhos e reflexões podem ser acessados no site www.analuizadefigueiredosouza.com.br , bem como em suas contas nas mídias sociais.