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Ady Canário Colunistas Destaque

Mulheres negras nas cidades e a esperança de uma política afirmativa

Feliz por participar desse projeto da revista Matracas voltada para abordagem jornalística com foco nos direitos humanos das mulheres! Inicialmente, destacamos as mulheres negras nas cidades e os desafios de uma política para construção das ações afirmativas no contexto da violência do racismo no Brasil. O que fazer para promover a igualdade racial das mulheres negras no contexto de desigualdades estruturais?

Ressaltamos as políticas afirmativas interseccionais que são voltadas para grupos sociais vulneráveis e estão historicamente em situações desfavoráveis na sociedade por diferentes fatores, sejam históricos, culturais e econômicos. Negros, indígenas, populações ribeirinhas, de periferias, entre outras formas de existência são alvo dessa política como imperativa de justiça e equidade social. Essas ações são medidas reparatórias focais em prol de grupos discriminados vítimas de racismo e preconceito visando à valorização e reconhecimento de suas histórias no passado, no presente e construção de seu futuro.

Evidentemente, dada sua importância no combate às desigualdades sociais e raciais, as políticas de ações afirmativas, como exemplo, a política de cotas para negros (autodeclarados pretos e pardos) na universidade e concursos públicos, provocam diversas demandas no enfrentamento às problemáticas em relação às condições humanas nas dimensões de classe, raça e gênero, especialmente para as mulheres negras, feministas, com deficiências e LGBTTQIA+ numa sociedade racista e sexista, dentre outros tipos de práticas. Nesse sentido, as ações afirmativas são oportunidades de refletirmos sobre o racismo, seu fenômeno e metodologias relacionais que perpetuam nas instituições para com as mulheres negras e sua baixa representatividade.

As estruturas sociais do racismo, sexismo e outras formas de discriminações estão presentes e produzem efeitos negativos sobre a vida. Afetam sobremaneira os grupos étnico-raciais que sofrem violências por conta do preconceito racial. Produzem a baixa remuneração, os postos de trabalho de menor prestígio e a baixa autoestima das mulheres negras. Assim, indagamos: por que mulheres negras? Porque sempre estivemos nas lutas e ainda somos parte de uma comunidade negra que sofre a falta de acesso à representação em razão do racismo institucional e no cotidiano.

Nesse contexto, nós mulheres negras temos vozes e coragem nos caminhos abertos, apesar de silenciadas pelo sistema opressor, que nos desqualifica, tornando nossos conhecimentos inválidos na cultura. Temos um papel fundamental por compreendermos as nossas opressões e a de outros grupos, sem hierarquização. É nas cidades que há de se reconhecer a importância das mulheres negras como “sujeitos” de direitos humanos. São relações desiguais de classe, gênero e raça no processo legado pela escravidão, até os dias atuais, e a suposta abolição da escravatura, bem como a ausência de políticas de inclusão e emancipação social.

Contudo, mulheres negras (re)existem contra os dispositivos de exclusão e dominação. A implementação de ações afirmativas são necessárias e dizem respeito a variados temas, principalmente no acesso ao trabalho e educação, como estratégias urgentes visando à inclusão social, o combate à discriminação racial e práticas descolonizadoras da atual ordem eurocêntrica do bem viver nas cidades. É no âmbito da (re)existência que as vidas das mulheres negras importam. (Re)existiremos!

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Clarissa Paiva Colunistas Destaque

Manifesto do útero

Aqui está quem, mesmo intocado e quieto, mesmo tão forte para fazer-se e desfazer-se
mensalmente, não tem um segundo de paz social.
É um tal de “- Não precisa mais dele… só é útil para gerar filhos”; ou também: “- Ah, que saco!
Lá vem esse inchaço indesejado! QUERIA TER NASCIDO HOMEM”; ou ainda: “- Tá perdendo a
validade, hein? Quando vai resolver ter um filho? O tempo corre!!!”
Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh! Dá pra ter respeito, por favor? Paciência tem limite.
Saiba você que, além de ser uma cavidade fecunda, mantenedora da vida, eu também tenho
sentimentos. Ou melhor: recebo o impacto direto deles. Não é legal ‘ouvir’ essas coisas.
Também não é legal ser maltratado. Fossem apenas as opiniões externas… Mas não são: falta
cuidado, sobram comportamentos agressivos, medicamentos e materiais tóxicos, descaso
continuado. Se é verdade que sou frágil, então cuidem de mim!
Tô falando assim, cheio de exclamações porque estou exausto; de verdade. Se algo não está
bom, se a alimentação não foi adequada, se há um embuste escroto na área, logo tenho que
suportar carregar aquele sangue todo sem conseguir descamar. Daqui a pouco eu mesmo crio
um mioma e nem percebo! Meu papo reto é para que parem de me diminuir. Parem de querer
me programar como a um computador. Apenas parem.
Sou força viva. De pequeno viro gigante, nutro, sustento, cocrio. O chakra do ventre é vital
para manter a sua alegria e energia; sou – jovem ou velho – essencial para você.
Meu manifesto é para que cuide de mim. Para que honre meus portais de vida; para que,
cuidando de mim, você conheça (e não esqueça) o seu valor.
Meu grito é para que grite, sempre que quiser. Para que saiba-se leoa, rainha de si e do seu
poder. É para que não me maltrate, e nem se perca.
Meu canto disfarçado de texto é para que dance. E dançando renasça. E renascendo, leve a
cura para outros ventres. E diga-lhes desde cedo: Você tem valor. Sacrário vivo, microuniverso,
vida em sua forma mais pura, plante e replante amor. A começar em si.

Com amor e coragem,
Seu útero.

Para ouvir: A começar em mim – Vocal Livre

Obs: Performance “Pater, Patrimônio Abandonado” de Magui Kampf, 2019. Registro fotográfico de Melissa Braga.

 

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Colunistas Destaque Fernanda Valéria

Como criar o hábito da leitura?

Dia 29 de outubro comemora-se o Dia Nacional do Livro, este senhor que já foi até ameaçado de sumir das prateleiras com o advento da internet e a publicação dos e-books. Mas, para surpresa e alegria de muitos, inclusive, desta pessoa que vos escreve, ele renasce das cinzas como uma fênix. 
Em pesquisa recente do setor editorial brasileiro, divulgada pela Folha de São Paulo, o mercado, somente no primeiro semestre de 2021, vendeu mais de 28 milhões de exemplares, 48% a mais em comparação ao mesmo período do ano anterior. A pesquisa ainda revela um acréscimo de 40% de lucro ao setor na comparação entre os mesmos períodos. 
Mas como andam as suas leituras? Em média, o brasileiro lê até cinco livros por ano, o dado é do Retrato da Leitura no Brasil, divulgado pela Agência Brasil, em 2020. Trata-se de uma média. Sabemos que poucos leem muitos livros, enquanto outros não leem nenhum, o mais importante é não se guiar por nenhum parâmetro e se sentir confortável no hábito de leitura que cada um tem ou quer para si. (Só um aviso – quando a gente começa, não para mais).
Para quem está no início, indico a escolha de temas do seu interesse. Exclua a preocupação de estar lendo os títulos da moda, ou aqueles indicados por pessoas que já têm o hábito consolidado ou por outras com interesses diferentes. Não que você não possa seguir as indicações, o ideal é captar delas, as leituras que lhe despertam o interesse. Sempre tem alguém que ama Literatura, outros, Filosofia, Autoajuda e demais áreas. Você vai escolher o seu nicho. 
Dedique, dentro do seu tempo, um período para a leitura. Como estamos falando de hábitos, o mais indicado é praticar todos os dias um pouquinho. Nada de querer ler um livro em um único dia, dessa forma, o que deveria lhe dar prazer, pode proporcionar cansaço, e aí você desiste. 
Estabeleça metas de leituras, como ler um capítulo por dia, ler durante meia-hora ou até menos – 15 minutos. Desde que não se esqueça da frequência estabelecida. Quando estiver no ritmo, aumentá-las, vai ser fácil.
A próxima dica serve também para os leitores assíduos. Não desperdice tempo e atenção lendo o que não gosta. Passadas as 20 primeiras páginas, a leitura ainda não lhe captou o coração? Feche o livro sem culpa. Existem muitos outros esperando por você no mundo, tenha a consciência de que nunca ninguém lerá tudo, então dedique-se aos que lhe dão prazer. 
Não conseguir dar continuidade a um livro pode ter várias razões: ele pode ser ruim mesmo, mal escrito, não te agrada ou você pode não estar preparado para ele e tudo bem, acontece. Eu mesma passei por isso, levei dois anos para conseguir finalizar o Memória da Casa dos Mortos, de Dostoiévski, não estava pronta emocionalmente para tanta densidade. 
Mastigue as palavras, as frases, os períodos, os capítulos e se permita mergulhar no texto. É preferível absorver o máximo dele e poder lembrá-lo depois a devorar vários e não captar a essência do que está escrito. Francine Prose fala sobre isso no Para ler com um escritor – já é uma dica de leitura.
Apesar do mercado aquecido, os preços continuam sendo altos, se o dinheiro é pouco – de quem não é? – Procure os sebos, compre os livros em promoções, estabeleça uma frequência de compras deles, pegue emprestado com pessoas que têm o hábito da leitura e devolva, por favor!!!! Outra possibilidade é fazer uma lista de desejos e comprá-los todos de uma vez só e ganhar o frete grátis. 
Tem também os e-books. Sim, são livros, o conteúdo é o mesmo!!! Eu passei a ler mais desde quando adquiri o kindle da Amazon, embora tenha o apego incondicional e irracional pelo cheiro das páginas impressas. Trata-se de equalizar o custo-benefício e saber quando é válida a compra do livro físico ou o digital. 
Caso tenha filhos, a prática pode começar cedo, crianças podem ser incentivadas com revistinhas em quadrinhos, de vez em quando é bom levá-las à livraria e deixá-las escolher. Não deixe que leve todos os que querem, combine de comprar outro logo que a leitura for concluída, funciona, hein!! 
Boas leituras, depois me conta se algo deu certo.