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Precisamos falar sobre isso: a Filosofia de Epicuro e a saúde mental, uma preocupação atemporal

A saúde mental é uma preocupação só contemporânea? Vos afirmo que não! Há milênios os filósofos vêm procurando uma vida feliz, uma busca incessante pela felicidade em meio a guerras, epidemias, pandemias e estruturas políticas em que desfavorecem a maioria da população; partindo deste contexto, que não é muito divergente dos nossos dias atuais, venho expor a filosofia de Epicuro e como devemos entendê–la de maneira a viver sem perturbações e desta forma melhorar a saúde mental.

Não busco escrever para doutores e especialistas na área, e sim, ao senso comum, às pessoas leigas, numa linguagem simples. Assim como busquei na minha graduação em Filosofia (UERN, 2015), com um tema baseado em Epicuro, com  o título A Filosofia de Epicuro como medicina da Alma, partindo da premissa que podemos, sim, viver feliz apesar das dores físicas e da alma, usando minha própria experiência de vida de forma resiliente em detrimento da minha deficiência física devido a artrite reumática ( doença auto imune que provoca dores lancinantes).

Fazendo um breve caminho histórico da vida do nosso filósofo: Epicuro (341 – 269 a.C) nasceu em Samos, na Grécia antiga, fundador do Epicurismo, que é uma filosofia pautada na vida simples, que prega a simplicidade do ser. Sua filosofia era propagada através de cartas aos amigos que propunha a busca da felicidade, ou seja, a saúde mental, onde esta só poderia ser alcançada a partir dos prazeres essenciais e necessidades para a vida.

Dessa maneira, Epicuro relatou em uma carta exposta por Diógenes Laércio, escritor que trouxe à tona o escrito,  a Carta a Meneceu,  cap, X, no livro Obras e Doutrinas dos Filósofos Ilustres. Nessa epístola Epicuro propôs princípios necessários a uma vida feliz, são eles: evitar as dores, procurar os prazeres moderados, atingir a sabedoria e a felicidade, o cultivo das amizades, a satisfação aos prazeres essenciais e necessários, como comer, beber e se relacionar; não temer a morte e nem aos deuses. Se distanciar da vida pública de ostentações, prestígio social, política, objetivando chegar a ATARAXIA – imperturbabilidade da alma, ou seja, o estado mental de conservação espiritual sem perturbações ao ser atingido pelas ações da vida do indivíduo.    

Primeiro, quero expor o que eu aprendi com a filosofia desse filósofo, como ele  me ajudou na busca do meu autoconhecimento e da felicidade, apesar das dores e perturbações. No meu estudo mais aprofundado sobre ele, descobri que sofria de dores físicas intensas devido a cálculos renais, que na época eram tratadas apenas com banhos  quentes, chás, e por incrível que parecesse, com coisas que nos dão prazer, como estar entre amigos conversando, rindo, comendo e filosofando. Desta forma a dor seria suspensa e traria alívio para dores tanto físicas quanto da alma, mas claro, tudo com a justa medida da moderação. Parafraseando Epicuro, um bom vinho e queijo é um dos melhores prazeres. 

Epicuro além de propagar suas cartas à felicidade, também escrevia junto aos seus discípulos nos muros da cidade frases de efeito com contexto da simplicidade da vida, e não aos excessos e bens materiais. Quem passasse lia e poderia refletir sobre suas vidas pregressas. Nosso filósofo escolheu viver em um lugar mais afastado da cidade onde não pudesse refletir o caos da era de Alexandre o grande, comprou um terreno e fez um jardim onde eram aceitos todos, que hoje podemos chamar “todos” e “todes”, sem restrições, algo muito surreal para as demais escolas filosóficas da época, que apresentavam muitas restrições em relação aos escravizados, mulheres, crianças, prostitutas etc. Este jardim ficou conhecido como O JARDIM DE EPICURO.

Ai te pergunto: como tudo isso fez melhorar minha saúde mental? Simples, percebendo que não precisamos ter, ser tudo na vida e, sim, prestar atenção na simplicidade do que é viver apesar das dores físicas e da alma, porque não há dor nem alegria que seja eterna. Vivemos de momentos felizes e não devemos nos preocupar com o que não temos controle, que devemos mudar, fazendo o que nos proporciona o bem estar físico e mental. Eu procurei na dança, na escrita de poesias, observar o belo da natureza. Pintar, desenhar, ou seja,  me reinventar sempre que algo fugir das situações previstas. Descobrir também que podemos amenizar a ansiedade, a depressão e os transtornos de comportamento, simplesmente pelo fato de se conhecer e se  reinventar.

Nesse contexto, como falei no início deste artigo, os problemas vividos pelo nosso filósofo não se distanciam tanto do que estamos vivendo hoje, especialmente em virtude da Pandemia da Covid-19, e no confinamento de quase 2 anos. As doenças mentais, como ansiedade, depressão e síndrome de pânico, vêm assolando a população, resultando em muitos suicídios e descontrole emocional, muito relacionado, também, a codependência das redes sociais, em ser aceito ou cancelado. O mundo voltou os olhos às redes sociais e suas implicâncias catastróficas na mente de muitos, onde quase tudo hoje é virtual, inclusive os “amigos”. Se tem um milhão de “amigos” e nenhum conversa com você, isso é uma solidão sem precedentes, dilacerando a saúde mental.

Em 2019 adentrei numa formação em psicanálise clínica, e me deparei com dados alarmantes em déficit de investimento em saúde mental, declarados pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para 2020 e 2021. A escuta clínica, focada na associação livre de Freud, poderia ajudar muitas pessoas antes que surjam transtornos mais graves. O que se vê são Capsis superlotados sem uma escuta profissional, somente focada nos psicotrópicos para amenizar os efeitos de tudo que se sente de ruim, anestesiando as pessoas. Tive relatos de uma paciente que tomava seis tipos de remédios diferentes  pois queria viver dopada para não sentir o vazio dentro de si. 

Os dados da OPAS (Organização Pan – Americana da Saúde) revelam uma falha mundial no fornecimento dos serviços de saúde mental de que precisam a população em momentos pandêmicos, onde se há necessidade crescente de apoio à saúde mental. Na última edição a OPAS mostra dados de 171 países, demonstrando uma indicação clara de que a atenção dada à saúde mental nos últimos anos ainda não resultou em aumento de demanda de profissionais e serviços de qualidade na área.

Diante disso, no Brasil, percebemos que o debate sobre prevenção da saúde mental ganha um pouco de espaço, sendo considerado um desafio, pois os dados são escassos  para uma análise precisa e ainda não há preocupação governamental para o assunto.  Situação semelhante ao que se vê nos dados mundiais. Mas reforço que em comum a ambos os distúrbios de humor, o mais comum é a depressão, e que está na nossa porta, pois apesar do SUS ter integrado muitas terapias integrativas, ainda não se dispõe em atividades nos postinhos de saúde, somente encaminhamentos para psicólogos para avaliação e encaminhamentos para os Capsis. Caso seja muito grave o caso psíquico, os pacientes de condição social mais privilegiada tendem a recorrer às instituições particulares.

O objetivo desses esclarecimentos, acerca da filosofia e da saúde mental, é projetar à sociedade que podemos ter uma saúde mental independente de tratamentos caros, com mudanças de postura diante das intempéries da vida, uma vida pautada em autoconhecimento e que é acessível  a todos e todes. A filosofia de Epicuro mudou minha vida, assim como a Psicanálise, através da SBPRN (Sociedade Brasileira de Psicanalise do Rio Grande do Norte), na qual planejamos a “Clínica Popular”, com preços acessíveis à população e Terapia na Praça para os moradores de rua.

A Psicanálise é um curso livre, oferecido por associações de psicanalises no país e ainda não é oferecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e nem pelo SUAS (Sistema Único de Assistência Social), pelo menos não em Mossoró. 

É importante destacar também que muitas terapias integrativas estão disponíveis para quem não se identifica a buscar seu próprio conhecimento através da mudança de uma filosofia de vida, de uma terapia clínica psicológica e psicanalítica. É preciso se mexer e ser resiliente, nesse sentido a internet pode contribuir bastante, pois como falei, as terapias estão aí. Busque, ajude-se, entre essas terapias têm o reiki, acupuntura, constelação familiar, arteterapia, meditação e muitas outras. O que não pode é se acomodar, pois como diziam os filósofos antigos “MENS SANA IN CORPORE SANO” ( Mente sã em corpo são – poeta romano, Juvenal).

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Precisamos falar sobre isso!

Hoje em dia chega a ser uma piada falar de sexualidade quando a protagonista é uma mulher com deficiência. O tema até vem sendo muito discutido, porém, ainda representa um enorme tabu. Existem inúmeras questões que parecem incomodar grande parte da sociedade. O sexo, por exemplo, algo natural na vida dos seres humano, mas para muitos, ainda parece um bicho de sete cabeças. Grande parte da sociedade enxerga a combinação sexualidade e deficiência como algo inimaginável, ou seja, um tabu duplo. Algo surreal, quando na verdade poderia ser natural tanto quanto muitas outras funções fisiológicas do corpo humano. Natural como cruzar, copular, transar, foder, fazer amor, como preferir.

Tanto é místico que não vemos discussões mais aprofundadas a respeito dessa temática. E quando há um debate, são terceiros falando por nós, deixando nosso protagonismo de lado. Mas por que não nos integram nessas discussões? Também queria saber. Contudo, partindo de minhas experiências pessoais, nesse artigo revelarei alguns aspectos da sexualidade de mulheres com deficiência. A ideia é esclarecer muitos pontos e tentar fazer com que a sociedade perceba que uma mulher com deficiência, por exemplo, não a torna assexuada. Posso afirmar que temos desejos de fazer sexo como qualquer ser humano que se intitula de normal.

O preconceito tem início, na maioria dos casos, no seio familiar, onde se infantiliza a pessoa com deficiência, não permitindo falar sobre sexo como algo natural e se for mulher, aí sim, desanda. Basta voltar um pouco na história para percebermos como sempre fomos enxergados. No passado, ainda bem pior que agora, éramos escondidos da sociedade, jogados de penhascos pois era considerado maldição nascer diferente. Éramos colocados em hospícios, mortos ao nascer com deformações. Na história da humanidade corpos imperfeitos eram considerados aberrações mostradas em circos, distrações nas cortes mais afamadas da Europa, enfim, um grande “circo dos horrores”.

Horror hoje é, na verdade, não ter o mínimo respeito pelas pessoas com deficiência, sempre achando que não somos capazes, sendo capacitistas, que é a maneira de achar que somos dignos de pena, doentes, exemplos para os que não possuem nenhum “problema” seja ele físico, visual, auditivo, orgânico ou mental. Precisamos ser percebidos com dignidade. Ter uma deficiência é apenas uma característica nossa, não precisamos de compaixão; não sejam capacitistas.

Afirmo, com conhecimento de causa, que mulheres com deficiência têm sexualidade sim. De acordo com IBGE (2010) há cerca de 25 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência, e mesmo assim em pleno século 21, ainda somos infantilizadas, ignoradas, discriminadas, não temos acesso à saúde sexual, não há adaptações físicas em UBS’s, em mamógrafos, não dispomos de macas adaptadas, entre outras ausências. A falta de adaptações nas unidades de saúde, por exemplo, é um fato que nos causa constrangimentos no momento que precisamos subir em um equipamento para a realização de um exame. É como diz a letra de uma música sertaneja, “é problema puxando problema…”. É assim que somos vistas pela sociedade, como um problema. Por mais que falemos, nada acontece. Somos obrigadas a nos adaptar ao meio se quisermos existir como seres humanos.

Muitas mulheres com deficiência iniciam suas vidas sexuais tardiamente devido a todos esses obstáculos impostos a elas. Muitas seque tem acesso, existe ainda o medo de se aventurar. Somente as que conseguem enfrentar todas essas barreiras e a própria família, assim como eu, conseguem ter uma vida “normal”. Antes de perceber que deficiência não é empecilho, conheci outras mulheres e homens com deficiências e abri meu leque de conhecimentos, percebi que não estava sozinha. É claro que passei por tristezas por não ter um corpo atrativo, desejado, padronizado etc; mas percebi que podia ser vaidosa, me amar e correr atrás dos meus sonhos. Sofri com alguns amores platônicos, com o preconceito dos rapazes que em muitos casos chega a ser cruel. Porém, foi só uma questão de tempo, aos 20 anos, um pouco tardio, claro, veio o primeiro beijo, um namoro arroxado. Foi quando percebi que podia viver mais que isso, compartilhava com amigas na minha condição ou não, e percebi que a troca de experiências é muito válida, principalmente quando a família não dá apoio. Na escola nunca se falava sobre sexo, tive que aprender sozinha através das experiências vividas e das revistas Carícia, Capricho, ícones nos anos 90. Descobri carícias, beijos de novelas, contato físico, prazer, orgasmo; aprendi a me masturbar. Esse conhecimento do corpo, se tocar é crucial para a mulher com deficiência. Meu objetivo é repassar essas experiências para outras mulheres na mesma condição que eu para que elas possam também se descobrir como mulheres que tem direito sim de ter uma vida sexual plena e prazerosa apesar da deficiência.

Aos que supostamente não creem que podemos casar, afirmo que esse é outro mito. Eu me casei duas vezes e se tiver oportunidade, caso de novo. Sou mãe de um filho, tive minhas realizações e fetiches sexuais satisfeitos e acredito não ter incomodado ninguém. Porém, muitas mulheres ainda tem medo de viver sua sexualidade, umas por falta de informações, outras pelos pais controlarem suas vidas, contas bancarias, ou até mesmo por falta de parceiros (as). A falta de uma assistência sexual também é uma carência muito significativa para muitas mulheres, principalmente as que tem deficiência. Para quem não conhece ou nunca ouviu falar, assistência sexual é um serviço de apoio sexual que sugere tanto o sexo na prática quanto teórico para nós pessoas com deficiência que não conseguimos um parceiro. Este tipo de serviço ainda não existe no Brasil, mas pode ser facilmente encontrado na Europa. Lá o serviço é dividido em seis órgãos com especificidades variadas para assistir as pessoas com deficiências e inclui fazer o sexo propriamente dito, sair para uma conversa, passear pegado na mão ou simplesmente um beijo.

Segundo Caryna Moreno, assistente sexual que atende na Argentina e não tem deficiência, a assistência é feita mediante entrevista prévia com a pessoa com deficiência para ver o grau de mobilidade, e através desta avaliação, tornar o momento de descobertas do prazer mais valoroso. Caryna relata que essa assistência contribui para o resgate e valorização da autoestima e descoberta do corpo como fonte infinita de libido. Ela também explica que muitos não chegam aos encontros por que não conseguem controlar suas contas e por serem confrontados pelos familiares. Na verdade, muito ainda precisa ser desmitificado. É importante destacar que muitos tem uma vida sexual ativa. Felizmente a indústria de equipamentos sexuais fizeram muitas adaptações para cadeirantes transarem com mais autonomia. Exemplo: cadeirinhas deslizantes e mini-macas para a companheira ficar no nível por parceiro, faixas para fixação do tórax ,entre outras. Ainda somos um número muito pequeno que damos a cara a tapa nos expondo sobre esse assunto, mas este é um trabalho de formiguinha. Queremos ter voz, pois mulheres com deficiência NÃO são assexuadas, não devem ser infantilizadas, temos sentimentos, desejos, direitos e necessidades sexuais (e não são poucas), iguais as mulheres ditas “normais”.

O que é preciso saber sobre a sexualidade da mulher com deficiência:

– Mulheres com deficiência intelectual NÃO são hiper–sexuadas, ou seja, desejos incontroláveis, como muitos teorizam;

– Mulheres com deficiência física não possuem disfunções sexuais relacionada ao desejo, à excitação e ao orgasmo;

– Mulheres com deficiência tem o DIREITO de escolher se querem ter filhos ou adotar;

– Mulheres com deficiência tem direito a exames preventivos, consultas com toda a acessibilidade e comunicação necessária;

– Mulheres com deficiência tem todo DIREITO de realizar fantasias sexuais com pessoas sem deficiências, que possuem desejos específicos por nós deficientes, os chamados DEVOTES;

– Mulheres com deficiência NÃO podem ser criminalmente esterilizadas por autorização de terceiros;

– Mulheres com deficiência têm DIREITO a viverem plenamente em sociedade com suas identidades de gênero, LGBTQIA+, sem preconceitos ou discriminação;

– Mulher com deficiência tem o total DIREITO de viver sua sexualidade somente pelo prazer;

– Mulheres com deficiência tem DIREITO a realizar toda, e quaisquer fantasias sexuais, se masturbarem e manterem o sexo só pelo prazer, com o apoio de assistentes sexuais especializados, ou profissionais do sexo, sem que sejam julgadas ou discriminadas.

Em países como Alemanha, Holanda, Dinamarca, Suíça, Áustria, Itália e Espanha, os assistentes sexuais trabalham livremente, ao contrário do Brasil onde o serviço sequer existe. Por experiência própria indico a massagem tântrica para fazer como terapia e autoconhecimento do corpo. Portanto, apresento aqui uma direção para debates, que podem ser propostos para uma visibilidade cada vez maior da temática mulher com deficiência, suas vivências em sociedade e sexualidade, para que sejam criadas instituições e políticas públicas de apoio a este público objetivando uma melhor qualidade de vida para nós mulheres com deficiência.

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Yáscara Samara

O Tabu da gravidez da mulher com deficiência

Pode-se afirmar que falar sobre sexualidade já é um enorme tabu hoje em dia, ainda mais quando se refere as mulheres com deficiência. Quando engravidam literalmente fere aos preceitos das pessoas ditas normais, posso considerar um triplo tabu a desmistificar e o porque a sociedade sempre vê como surreal uma mulher com deficiência engravidar.

Não faz muito tempo, uns quinze anos, me descobri gravidíssima, positivo em todos os exames, dai tudo e todos acharam um absurdo total; mas por quê? Porque ninguém esta preparado para ver e falar sobre isso. A sociedade tende a infantilizar as pessoas com algum tipo de deficiência e isola de alguma forma para o convívio com tudo e todos, desmerecendo nossa capacidade de viver uma vida ativa e normal de acordo com nossas capacidades, ou seja, uma visão capacitista que somos coitadinhos, que somos apenas dignos de pena e solidariedade dos outros sempre.

Nunca tive problemas com minha sexualidade, sempre fui escancarada a falar sobre e percebi que as pessoas ficavam curiosas. Era uma enciclopédia de perguntas que nunca tive o menor problema em responder, e quando fiquei grávida também não. Apesar de ter sido uma surpresa para mim também, agi com surpresa e alegria, até porque os médicos foram muito taxativos em decretar que eu não podia engravidar, “então estou com o que Doutor? Um tumor que não é!”

Quando andava na rua, pois foi melhor época de saúde que tive, as pessoas grudavam os olhos em mim e não tiravam, além de perceber minha deficiência que, diga-se de passagem, é bem notória, devido a Artrite Reumatoide quando criança, resultando em deformações graves nos braços, mãos, pernas e dificultando minha marcha. Elas não tiravam os olhos do meu barrigão. Logo, ouvia de tudo que muitos jamais escutariam se fossem sem deficiências.

As perguntas eram de certa forma constrangedoras, mas a curiosidade e desinformação das pessoas eram maior ainda, fazendo em todos os lugares que me viam. As perguntas eram: “Oh minha filha, tadinha meu Deus quem foi que fez essa malvadeza com você?”, “você é casada?”, “seu marido é aleijado também?”, “seu filho vai nascer deficiente também né?”, “isso ai é um tumor, não é?”, “ei, já mandou prender o homem que te fez esse mau?”, “mulher, o que foi isso que fizeram com você?”. As vezes eu respondia: “eu quem quis mesmo, transei e aconteceu, normal”. Mas o normal fere, o capacitismo ainda é uma constante em nossa sociedade, ninguém sabe lidar com mulheres com deficiência e como nossas fase de vida são iguais. Gente ser diferente é normal! Temos que ser vistos em todos os lugares, se não, termos sempre voz nos meios e redes sociais. Nossa luta já quebrou muitas barreiras, mas muito ainda precisa ser feito para uma educação inclusiva de qualidade, e preparação de professores nas escolas, assim como palestras de conscientização nessas para uma inclusão verdadeira na prática, e o mais importante, sendo nós, pessoas com deficiências, como protagonistas destas capacitações, pois em muitas ocasiões apenas vejo terceiros falando sobre, sem ter ao menos sentido na pele o que é ser uma pessoa com deficiência e suas especificidades.