Cordelistas de todo o país se mobilizam contra o machismo na literatura de cordel

A invisibilização de escritoras e poetas mulheres na literatura brasileira atravessa a história. No mundo da escrita, universo que por séculos foi de dominação masculina, muitas escritoras tiveram que lutar para garantir seus espaços, algumas tiveram que recorrer ao anonimato, pseudônimo masculino, para terem suas obras publicadas.

A escrita literária feminina tem ascendido ao longo da história, mas a literatura continua sendo, também, um espaço de resistência das mulheres.  Para as mulheres que atuam na Literatura de Cordel, por exemplo, a luta contra o machismo continua e levantou uma grande mobilização. Através do Movimento Nacional das Mulheres Cordelistas Unidas em Combate ao Machismo, as mulheres tentam denunciar as variadas formas de violência sofridas nesse espaço.

De acordo com a cordelista Izabel Nascimento, o movimento foi uma resposta aos ataques históricos que todas as mulheres sofrem individual e coletivamente no cordel. “Ele teve início durante um encontro virtual da Feira Literária de Campina Grande, em 27 de junho de 2020, onde participei de uma Mesa ao lado dos cordelistas e amigos Aderaldo Luciano (RJ) e Nando Poeta (RN), ressaltei a presença da mulher no cordel. Ainda durante a live, mais precisamente no chat, sofri ataques, que se multiplicaram em grupos de WhatsApp. Deste evento, surgiu o Movimento Nacional das Mulheres Cordelistas contra o Machismo”, explica.

A mobilização ganhou força a partir da nota de repúdio que foi feita na ocasião e compartilhada nas redes sociais. Atualmente dezenas de coletivos de mulheres, dentro e fora do universo da poesia, estão engajados nas ações. Izabel confirma que até o momento mais de 1500 nomes já integram a luta, inclusive nomes que chegaram potencializando a luta como o de Maria da Penha, Monja Cohen, Socorro Lira, Camila Mendes e outras.

O machismo sofrido pelas cordelistas não difere do machismo que ocorre dentro da sociedade, conforme constata Izabel. “Não se trata apenas de um problema isolado, ou de uma lista com itens que afetam somente as mulheres cordelistas. O machismo que está estruturado e profundamente enraizado na sociedade também se manifesta no cordel. Este é o ponto principal da nossa denúncia: dizer que há machismo no cordel, ao contrário do que se imagina. A tentativa de apagamento, o assédio, o desrespeito, a objetificação da mulher são pés através dos quais o machismo caminha também no universo poético cordelista.

Izabel defende que o cordel tem um potencial gigantesco no diálogo com a sociedade, inclusive, atuando em outras bandeiras de lutas sociais como a homofobia e racismo. “Historicamente, o cordel tem narrativas do cotidiano que levantam importantes discussões. Quando o movimento nacional das mulheres cordelistas denuncia o preconceito e promove um debate sério e profundo dentro de uma sociedade ainda fechada para nós, estamos também fazendo outras denúncias de apagamento, preconceito e exclusão. Desse modo, nossa luta está sim, engajada às lutas contra o racismo e a homofobia, que também são marcados no cordel brasileiro.

A hashtag Cordel sem Machismo ganha força e adesão

O movimento vem se fortalecendo a cada dia e tem contado, também, com o apoio de parte dos cordelistas homens.  “A luta tem sido articulada através das redes sociais, canais de comunicação, no YouTube e Instagram. Dentro das ações vem sendo realizadas palestras, encontros e vídeos informativos. Acessando a Hashtag #cordelsemmachismo é possível acessar muito do que foi produzido e divulgado nas redes. O coletivo também formou um grupo de estudos chamado Estante Feminista para estudar, compreender e valorizar a produção acadêmica feminina sobre o cordel. Temos um planejamento para as próximas ações, que divulgaremos em momento oportuno”, destaca.

O “Cordel sem Machismo” certamente já colhe bons resultados. Ainda segundo Izabel após o movimento, a Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC) elegeu como Presidenta a cordelista e médica Paola Torres. “Uma ação que, mesmo não estando diretamente ligada ao movimento, faz parte, certamente, dos desdobramentos das lutas das mulheres na sociedade. Para mim, a Academia tem muito a ganhar com a presença feminina liderando a instituição, tanto pela capacidade, responsabilidade, talento e respeito com o qual a Dra. Paola conduz o cordel, quanto pelo que significa neste momento da História, uma mulher nos espaços de liderança, até que não seja mais uma novidade liderarmos”, diz.

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