Mulheres negras e reparação

“Muitas fugiam ao me ver
Pensando que eu não percebia
Outras pediam pra ler
Os versos que eu escrevia

Era papel que eu catava
Para custear o meu viver
E no lixo eu encontrava livros para ler
Quantas coisas eu quiz fazer
Fui tolhida pelo preconceito
Se eu extinguir quero renascer
Num país que predomina o preto

Adeus! Adeus, eu vou morrer!
E deixo esses versos ao meu país
Se é que temos o direito de renascer
Quero um lugar, onde o preto é feliz.”

“Carolina Maria de Jesus, em Antologia pessoal. (Organização José Carlos Sebe Bom Meihy). Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996”

Neste 25 de julho, pelo “Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha”, fazemos ecoar, na epígrafe, a voz que nos inspira, da escritora, poetisa, compositora, Doutora Honoris Causa, Carolina de Jesus (1914-1977), para falar da dívida histórica do Brasil com as mulheres negras, que ao longo de século, vem requerendo uma reparação, ao reconhecer a dívida histórica diante da escravidão e do tráfico de africanos e africanas.
Certamente reparação e equidade guiam nossas lutas pois ainda temos muito preconceito e racismo na sociedade. Por isso, clamamos por reparação! As mulheres negras estão nos subempregos e ainda não ocupam postos de liderança.
Nesse sentido, um levantamento (Agência Patrícia Galvão) baseado nos indicadores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), mostra, por exemplo no mercado de trabalho – na empregabilidade, na renda, ocupação de trabalho desprotegido, cargos de chefia e serviços domésticos -, a seguinte situação:
Dados da pesquisa:
  • A taxa de desemprego geral ficou em 9,3% no segundo trimestre de 2022. Entre as mulheres negras, o indicador ficou em 13,9%. Já entre os homens negros a taxa é menor que taxa nacional: 8,7%. Já entre as mulheres brancas, o desemprego constatado foi de 8,9%; e os homens brancos, 6,1%, a menor taxa entre os grupos. 
  • Sobre o rendimento, enquanto o homem branco recebeu em média R$ 3.708 e a mulher branca R$ 2.774, a trabalhadora negra ganhou, em média, R$ 1.715, e o homem negro, R$ 2.142. A mulher negra recebeu 46,3% do rendimento recebido pelo homem branco. Para o homem negro, essa proporção foi de 58,8%.
  • E segue mostrando, acerca de trabalho desprotegido, entre os ocupados em trabalho desprotegido, entre a população negra o índice era de 47,1%, mas entre as mulheres negras chegava a 47,5%, e entre os homens negros, a 46,9%.
  • Também revela, que em cargos de direção e gerência, mais uma vez, as mulheres negras têm o menor índice de ocupação nessas funções: 2,1%. Os homens negros têm 2,3%. Entre as mulheres brancas, o índice chega a 4,7%, e entre os homens brancos, a 5,6%. 
  • Dado em destaque: as mulheres negras têm maior participação em serviços domésticos: no comércio e em educação, saúde humana e serviços sociais, contudo, frisamos, em atividades domésticas. Vejam bem: no caso dos serviços domésticos, a proporção (16,4%) é quase o dobro em relação à participação das mulheres brancas (8,8%). Já no segmento de informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas, as mulheres brancas têm maior participação (14,3%) em comparação às negras (9%).

 

Portanto, não há como fugir dessa luta constante. Diante desse contexto, reafirmamos que as mulheres negras têm o direito à reparação, sim, pois ainda somos as mais prejudicadas no mercado de trabalho dado o racismo. Esse é o desafio para mais conquistas. 

Para conseguirmos a eliminação de desigualdades raciais e de gênero em todas as suas transversalidades torna-se mais que necessário uma política pública na articulação entre as mulheres negras, entidades, coletivos e instituições. Que possamos fazer valer a vida e os direitos de todas as mulheres negras. Reparação é possível e necessária!

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